Susan estava certa: não demorou mesmo para regularizar minha situação
no colégio. Em três dias eu estava em um avião com destino ao norte,
para nunca mais voltar. Em todo o trajeto, eu me lembrava de como havia
sido minha última conversa com Renée e Phil. Eu estava agindo de forma
infantil e mimada. Eu gritei com eles e fiz falsas acusações. Joguei na
cara de Phil que ele não era meu pai biológico e agora que estava
arrependida, não podia me desculpar com nenhum dos dois. Durante todo o
tempo no avião, eu pensava em como as coisas teriam sido se essa última
conversa nunca tivesse acontecido.
O tempo passou muito rápido lá
dentro, e assim que chegamos ao aeroporto, Susan quase me obrigou a
comer e a tomar alguma coisa, mas eu relutei. Logo Susan chamou um táxi
para nos levar para a casa dela, quer dizer... agora era nossa casa.
―
Eu tenho certeza de que você vai gostar daqui. Não vai ter muita
mudança no seu cotidiano. Você vai ter sua própria suíte ― Susan falou
com certa animação em sua voz, apesar da tristeza que pairava sobre nós.
― Legal. Mas não precisa se incomodar comigo. Eu vou ficar bem, só não quero incomodar, tia Susan.
―
Você não vai. Eu sempre vivi sozinha, então vai ser ótimo ter alguém me
esperando após o trabalho ― ela disse enquanto subia as escadas com
duas malas nas mãos. Ela me guiou por um caminho que não era familiar
para mim e então continuou: ― Esse vai ser o seu quarto. Eu pedi para
uma amiga vir aqui e dar uma arrumada em tudo para você. Tome um banho e
descanse um pouco antes de esvaziar as malas, está bem?
― Tá ―
assim que eu terminei de falar, ela me deu um beijo na testa e saiu
fechando a porta do quarto. Eu tentei me familiarizar, observando cada
parte do cômodo. O armário era bem amplo e sobraria muito espaço dentro
dele, já que quase todas as minhas roupas eram para dias quentes, e
essas eu tinha deixado na casa antiga. A cama era bem espaçosa e
confortável, mas não me passava aquela sensação de familiaridade. Fui
até o banheiro e lá tinha todos os produtos de higiene pessoal que eu
que eu poderia precisar, então resolvi tomar um banho. Passei vários
minutos na banheira, sentindo uma dor aguda dentro do meu peito, perto
do meu coração, fazendo as lágrimas descerem sem controle.
As
férias mal haviam começado, e eu teria muito tempo para ficar me
martirizando ao pensar na culpa que eu tinha pela... pelo que tinha
acontecido com meus pais, exatamente como estava fazendo naquele
momento.
Finalmente decidi que era hora de sair do banho, pois a
água já estava muito fria e minha pele já estava enrugando. Enrolei-me
na toalha e sai do banheiro indo em direção às minhas malas. Peguei um
velho moletom que minha mãe tinha me dado e me vesti, indo lentamente em
direção à cabeceira da minha cama e me sentando lá, apoiando minha
cabeça na própria cabeceira, cerrei meus olhos. Comecei então a pensar
em como seria difícil a vida sem os meus pais por perto, como eu teria
que me adaptar as várias mudanças de uma única vez. Não seria fácil, eu
sabia disso. Talvez fosse melhor se...
― Bella ― Susan interrompeu
meus pensamentos enquanto entrava no quarto indo se sentar ao meu lado.
― Você precisa comer alguma coisa antes de dormir.
― Não, obrigada. Eu... não consigo comer nada agora, Susan.
―
Mas você precisa comer, eu preparei o jantar para nós duas. É sua
primeira noite aqui, vamos fazer as coisas direito, está bem?
― Mas, Susan...
―
Mas nada, você vem comigo agora! Não vou deixar você maltratar o seu
organismo dessa forma. Vem, eu prometo que você vai gostar do que eu
preparei.
Susan me puxou pela mão antes que eu pudesse responder e
me levou para a cozinha, onde já havia sobre a mesa os pratos, os
talheres, os copos e um apoio para pratos quentes.
― Eu sei que
diferente das meninas da sua idade você não é obcecada em se manter
magra, então eu me arrisquei em fazer uma lasanha, espero que você goste
― Susan falou enquanto retirava a lasanha do forno e a colocava sobre o
apoio no centro da mesa.
― Eu gosto muito ― eu disse e finalmente me sentei à mesa.
― Você prefere suco ou coca-cola? ― ela falou com o rosto dentro da geladeira.
― Coca, por favor.
―
Aqui está ― ela disse colocando o refrigerante sobre a mesa e
sentando-se, finalmente. Em seguida ela nos serviu com refrigerante. ―
Dê-me o seu prato para eu servi-la ― peguei o prato nas duas mãos e
apoiei os cotovelos na mesa para não balançá-lo, mais ou menos como uma
criança faz quando vai ter sua comida servida. Após encher o meu prato,
Susan serviu-se também, e começamos a comer em silêncio, ao qual eu
quebrei.
― Obrigada por tudo o que está fazendo por mim, tia Susan.
― Você não tem que me agradecer, Bella, eu faço isso porque gosto de você, como se fosse minha filha.
―
Talvez não seja uma coisa muito saudável para você, mas... eu também
gosto de você como uma filha gosta de uma mãe ― eu admiti.
― E por que isso não seria saudável para mim? ― Susan parecia intrigada.
― Eu amava a minha mãe, no entanto ela morreu por minha culpa.
― Não repita isso. Não foi sua culpa, foi um acidente.
―
Se eu não tivesse dito que não queria ir ao México, Phil não teria me
ligado, não teria discutido com a minha mãe, não teria batido o carro,
então... como pode não ser minha culpa?
― Teria acontecido de todo jeito, com ou sem você no carro! ― ela me assegurou.
― Como sabe? ― perguntei espantada.
― Apenas sei, é um fato. Coisa do destino, talvez.
― Você me pareceu muito segura...
― Não vamos mais falar sobre isso, ok? Outro dia a gente continua a nossa conversa, pode ser?
―
Tá ― eu acenei uma vez com a cabeça e coloquei um último pedaço de
lasanha na boca. ― Estou satisfeita, será que agora eu tô liberada para
ir pro meu quarto?
― Está sim. Boa noite.
― Pra você também ―
saí da cozinha e fui em direção às escadas, com destino ao meu quarto.
Chegando lá, escovei os dentes e fui direto para cama.
Seria uma noite longa. Muito longa.
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