~ 11 ~
Robert
Cansado. Revoltado. Cético.
Patético!
Qual palavra poderia definir melhor a situação em que me encontrava naquele exato momento?
Durante os últimos dias, eu tentei ser para Linda o tipo de homem que conseguiria derreter até mesmo o mais petrificado dos corações! Até eu daria uma chance a mim mesmo depois de todo o esforço que tenho demonstrado!
Mas Linda parece não se importar, porque simplesmente não retribui nada do que faço por ela! Ainda que minhas intenções não sejam exatamente as que tento passar, como ela saberia? Apenas James e eu sabemos da maldita cláusula no testamento de Frederick.
Durante todo o dia de sábado, liguei para o meu mais novo objeto de cobiça infinitas vezes. Ela não me atendeu uma vez sequer, contudo.
As hipóteses eram inúmeras, mas eu me recusava a crer, da forma mais veemente possível, que Linda estivesse me evitando e ignorando deliberadamente. Apesar de ela estar reticente, no fundo eu sabia que eu mexia com algo dentro dela, eu só ainda não havia descoberto como administrar bem essa situação. No entanto, todos os sinais involuntários de Linda, me faziam perceber o quanto ela me queria, o quanto ansiava por se render a mim.
Assim sendo, por volta das sete horas da noite, decidi ignorar o fato de não ter minhas ligações atendidas, e me encaminhei para o apartamento de Linda. Ela não se recusaria em me receber se eu já estivesse lá, eu poderia apostar. Fazer algo assim não era do seu feitio.
Deixei minha cobertura, no centro da cidade, e dirigi até um ponto afastado, às suas margens, onde Linda vivia. Entretanto, nem mesmo cheguei em frente a seu prédio antigo, quando reduzi ainda mais a velocidade do carro, assim que a vi.
Com um homem.
Sorrindo e conversando animadamente, enquanto se acomodava no banco do passageiro de um Volkswagen antigo de duas portas, praticamente caindo aos pedaços. O homem que a acompanhava tomou o lugar atrás do volante e, aparentemente sem que nenhum dos dois pudesse me ver, partiram.
Por consideráveis segundos, fiquei estático no meu lugar, parado em meio à rua, completamente incrédulo com a cena que acabara de ver.
Linda não poderia ter um compromisso, poderia? Porque se fosse esse o caso, Christine deveria saber de algo, e deveria ter me alertado!
Christine!
Como se aquela víbora estivesse realmente disposta a ajudar! Como se ela ao menos soubesse o significado da palavra eficiência!
Bufei irritado, ciente de que poderia enumerar mil e um motivos capazes de explicar e justificar esse fato. Todavia, isso demandaria tempo, e isso era algo que eu não tinha. Eu já havia perdido tempo demais até agora e, desistir de Linda após tanto esforço empregado, estava fora de cogitação. De fato, a simples menção da palavra “desistência” me deixava aborrecido.
Não me lembro de alguma vez já ter desistido, e eu não mudaria isso. Não por uma mulher.
Empurrei o pedal do acelerador, e o motor do carro roncou gentilmente.
Eu iria atrás de Linda, e averiguaria para saber quem era aquele homem, e o porquê de ela se sentir tão à vontade com ele. Se eles tivessem algum compromisso, bom, eu daria um jeito de consertar essa situação.
***
O lugar era movimentado, porém não havia requinte, ali. As paredes eram de um tom vermelho desbotado, mas com a baixa iluminação, esse fato não se tornava algo assim tão incômodo. No fim de tudo, as pessoas ali presentes não pareciam se importar para esse fato.
Na verdade, havia um aglomerado no meio do que seria a pista de dança, e casais eram embalados pelo ritmo frenético de uma música tipicamente latina. Eu não fazia ideia de que ritmo era aquele, mas ao julgar pela desenvoltura de Linda e seu acompanhante, eles sabiam não apenas denominar o ritmo, como conduzi-lo.
A forma como eles pareciam à vontade um com outro, denotava uma intimidade muito maior do que a que eu presenciara minutos atrás, em frente ao prédio de Linda. Eles não paravam de sorrir, dançar, e distribuir toques entre si, o que já estava me irritando.
Na verdade, estava elevando meu estado irritadiço, uma vez que meu humor não estava um dos melhores já há algum tempo.
Notei quando alguns casais pararam sua dança, apenas para observar Linda e o homem que a acompanhava, dançando com desenvoltura pelo salão, parecendo preencher todo ele.
Pareceu-me impossível não notar como ela estava diferente naquela noite. Diferente de como se vestia para ir ao escritório, diferente de como se vestiu para sair comigo. Diferente de tudo o que eu já tinha visto, até então.
Os terninhos sempre muito sóbrios ou mesmo os jeans despojados, deram lugar a um vestido azul marinho, que abraçava cada curva de seu corpo. Agora eu podia afirmar sem sombra de dúvida, que ela tinha um corpo muito bem esculpido. Ela usava saltos não muito altos, mas que lhe deixavam um ar de elegância. Seus cabelos caíam soltos e, balançavam junto com ela ao ritmo da música.
À medida que o tempo passava, mais casais se contentavam apenas em olhá-la. Não só a ela, mas também o homem que não a deixava por um único instante. Os quadris de Linda traçavam com perfeição o ritmo marcado pela música, como se eles mesmos o fizessem. As mãos de seu acompanhante seguraram firmemente sua cintura fina, aproximando seus corpos que, agora dançavam com ainda mais sincronia.
Era uma dança sensual, e não havia dúvidas. Mesmo de longe, eu sabia que os olhares trocados eram intensos, ainda que fosse apenas para encenar a melodia. Afinal, dizem que também se dança com os olhos.
No caso de Linda, ela parecia dançar com corpo, alma, olhos e um belo sorriso que não deixava seus lábios. Sorriso esse, sempre destinado a seu parceiro, que lhe retribuía da mesma forma.
Num movimento lento e envolvente, Linda ergueu suas mãos para o ar, sem jamais perder o ritmo traçado por seus quadris. O homem que dançava com ela, aproveitou esse gesto para deixar suas mãos correrem livres por sua cintura, até a parte mais alta de seus quadris fartos.
Por um motivo totalmente desconhecido, aquele gesto me irritou, e eu me peguei ansiando por ir até lá, e tirar Linda dos braços dele.
Ela era minha, e eu odiava dividir!
Contudo, o bom senso me lembrou de que eu não sabia o que aquele homem realmente significava em sua vida, nesse caso, eu precisava me controlar. Talvez aquilo não fosse nada demais, e meu lado possessivo estivesse apenas exagerando. Mas por que ela parecia tão à vontade e espontânea com ele? Por que comigo ela se portava de forma tão diferente?
***
Mais duas músicas depois, um trio de garotas se aproximou do casal que eu insistia em observar com afinco. Eles trocaram algumas palavras, e vi quando Linda se afastou, deixando o homem com quem estava, na companhia das garotas, aparentemente ensinando-lhes alguma coisa.
Linda se encaminhou até o bar, e eu a segui, abrindo espaço entre o aglomerado de pessoas, para que eu pudesse passar.
— Um refrigerante, por favor — ela pediu educadamente ao senhor de bigodes grisalhos atrás do balcão.
— Será que eu posso me oferecer pra pagar, senhorita? — murmurei às suas costas, fazendo com que Linda se virasse abruptamente, pousando seus olhos arregalados no meu rosto.
— Robert? — ela testou incrédula. — O que faz aqui?
— Tive um dia difícil — comentei num suspiro cansado. — Decidi... sair pra relaxar! — dei de ombros, denotando indiferença.
Ela me fitou com o cenho franzido, aparentando confusão. Meus olhos analisaram seu corpo demoradamente, porque afinal, eu só havia feito isso de longe. Agora, com a pouca distância, os detalhes eram infinitamente mais interessantes.
Percebi quando Linda pigarreou, então voltei meu olhar para sua face rubra, e seus olhos parcialmente encobertos por espessos e longos cílios negros.
— De tantos lugares pra se divertir, como você veio parar justo nesse? — inquiriu num murmúrio.
Ok! Essa era minha deixa para falar o que ela supostamente estava querendo ouvir. Ou o que a deixaria mais feliz, porque se tratando de Linda, era provável que houvesse uma diferença significativa aí!
— Eu pensei em que lugar você me levaria, caso tivesse atendido alguma das minhas inúmeras ligações — retorqui ainda observando seu rosto.
Seus olhos pousaram sobre mim, e sua boca se abriu, em busca de algo para falar, mas antes que pudesse fazê-lo, foi interrompida por uma voz com acentuado sotaque espanhol.
— Sua bebida, chica! — o homem de bigodes falou.
Linda murmurou um “obrigada”, agarrou o copo com sua bebida sobre o balcão, e sorveu um gole generoso.
— Está tudo bem? — eu quis saber, a ponto de perder a paciência com aquele silêncio, em especial.
— Claro — apressou-se em afirmar, acenando com a cabeça de modo a dar mais ênfase no que acabara de falar. — Eu estou ótima!
— Sei... ótima, e ocupada — opinei. — Por que não atendeu a nenhuma das minhas ligações? — instiguei sem mais rodeios.
Afinal, quanto tempo mais eu teria antes que viessem procurá-la?
— Você me ligou? — perguntou-me inocentemente. — Meu celular... ele está esquecido dentro da minha bolsa, provavelmente sem bateria, ou no modo silencioso.
— Linda — eu chamei num sorriso descrente. — Eu a observei nos últimos minutos — informei-lhe. — Se você tem alguma coisa com aquele cara na pista de dança...
— Mas é claro que não! — protestou visivelmente ofendida. — Javier e eu somos amigos, e isso é tudo! Se houvesse algo de mais entre nós, eu jamais teria saído com você, eu...
— E por que não? — interrompi-a, sentindo o último grama de paciência se esvair. — Você não fez nada de errado! Foram apenas conversas inocentes e sem segundas intenções!
— Ainda assim, seria estranho, e completamente errôneo aos meus olhos! — afirmou um pouco mais alto. — Eu não saio por aí me aproveitando das pessoas!
— Talvez o problema resida aí — zombei num murmúrio débil, mas que não deixou de ser percebido por Linda.
— O quê? — testou atordoada. — Eu... eu não... você!... Argh! — ela gemeu em protesto, dando-me as costas e batendo o copo com refrigerante sobre o balcão, fazendo com que parte do líquido fosse derramado.
Soltei o ar com força pela boca, ciente de que minha falta de controle estava se mostrando um péssimo aliado. Ou um excelente inimigo, que fosse!
— Olha, eu não quis dizer isso, ok? — emendei. Mas que droga! Eu estava mesmo prestes a pedir desculpas?! — Desculpe — murmurei a contragosto, num esforço hercúleo para não soar irritado por ter que fazê-lo. Linda não esboçou nenhuma reação. Permaneceu de costas para mim, concentrada demais no copo em sua mão para se dignar a me olhar. — Vai fingir que não estou aqui?
— Estou apenas tentando não derramar o refrigerante que resta na sua roupa de grife! — ela me devolveu num tom baixo.
— Você disse o quê? — questionei-a ainda sem acreditar no que acabara de ouvir. Como ela conseguia mexer tanto com meu humor? Por que suas ameaças débeis não me irritavam, mas provocavam outro tipo de reação?
Eu só percebi que estava sorrindo... sorrindo, não: verdadeiramente rindo, quando Linda se virou lentamente e me lançou um olhar inquisidor.
— Isso não foi engraçado! — ralhou.
— De modo algum — concordei falsamente. — É só que... — eu busquei uma forma de explicar-lhe, mas parecia impossível até mesmo para mim. — Tudo bem, eu desisto, não tenho ideia do que acabou de acontecer! — disse-lhe jogando as mãos para cima, num claro sinal de rendição.
— Eu não sou uma aproveitadora, Robert — insistiu seriamente, fazendo com que minha expressão espelhasse a sua. — Javier é meu amigo, e eu já lhe disse isso, quando saímos para jantar — lembrou-me. De fato, ela tinha comentado alguma coisa sobre uma família por consideração. Mas como eu poderia imaginar que o homem que praticamente a devorava com os olhos na pista de dança, era o mesmo por quem ela dizia sentir um amor fraternal?
— Isso eu entendi — adverti-lhe. — O que me interessa saber, é o que eu sou, exatamente! Achei que tudo tivesse se resolvido no exato momento em que fui até sua casa e me desculpei por...
— Você... — ela me interrompeu numa voz firme, que não condizia com sua expressão. — Você também é um amigo, e... — Linda se interrompeu, respirando pesadamente, como eu fizera há pouco. Seus argumentos haviam acabado, aparentemente, e ela deu de ombros, mordendo o lábio e cerrando os olhos.
Eu estava consciente de que aqueles não eram gestos com conotação sexual. Linda não estava flertando comigo, ela estava apenas sendo ela mesma. Ainda assim, não pude evitar a resposta do meu corpo, que ficou completamente alerta e ciente do de Linda.
O que estava acontecendo comigo, afinal?
— Você parece à vontade com ele, de uma forma que parece impossível comigo! — apontei. Talvez se nós nos mantivéssemos falando, essas reações se dissipassem.
— Essa acusação não é justa — murmurou em resposta. — São situações tão distintas, quer dizer, isso é uma danceteria... estou sob efeito da endorfina, eu...
— Talvez se você não estivesse me evitando há tantos dias, pudesse ser eu naquela pista de dança com você, e não Javier — eu dei ombros, assistindo Linda suspirar cansada.
— É complicado — defendeu-se. — Ele precisa de mim, agora...
— Eu preciso de você! — retorqui.
Os olhos de Linda praticamente saíram das órbitas, enquanto ela me encarava perplexa. Eu busquei algum vestígio de falsidade no que acabara de dizer, mas não consegui encontrar. Eu realmente precisava dela. Precisava que ela deixasse Javier ali, plantado, e decidisse ir embora comigo, porque então eu...
— Ele não conseguiu um novo emprego — balbuciou com o cenho franzido, como se nem mesmo ela coseguisse entender o significado de suas palavras. — As entrevistas dessa semana não tiveram os resultados que esperávamos, e ele estava péssimo! Eu só queria fazê-lo se sentir melhor... — explicou-se.
Fazê-lo se sentir melhor? Ela fazia ideia do quão dúbia soou essa frase?! Ele com certeza parecia se sentir infinitamente bem enquanto mantinha seu corpo colado ao de Linda! Eu não queria nem pensar sob quais hipóteses ele ficaria melhor do que aquilo!
— Todo o problema é esse, então? — quis saber. Linda meneou a cabeça debilmente uma única vez, de modo afirmativo.
Se essa era a questão, eu poderia resolvê-la.
Obviamente, eu não empregaria Javier na R Blackwell Corporation, porque quanto mais tempo longe de Linda, melhor! Contudo, com um telefonema ou dois, eu poderia perfeitamente bem conseguir que ele fosse contratado na Wood Business! Não demoraria muito para que eu fosse o acionista majoritário, então, não haveria problema algum!
— Acho que posso ajudar — eu disse a Linda numa falsa ponderação. Seus olhos se iluminaram com a expectativa, então eu soube que, o que eu diria a seguir, não soaria absurdo! — Mas tem uma condição...
— Estou ouvindo — apressou-se em dizer.
Eu sorri em resposta.
Linda seria minha, muito antes do que ela poderia prever!
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