~ 12 ~
Melinda
Você está fazendo a coisa certa! Está fazendo a coisa certa!
Eu vinha repetindo essas palavras em minha cabeça como um mantra, nas últimas horas, convencendo a mim mesma de que, amigos verdadeiros devem cometer sacrifícios para ajudarem um ao outro!
Nesse caso, eu não deveria medir esforços quando o objetivo era ajudar Javier! Ele era o meu melhor amigo... meu único amigo, na verdade! Não poderia deixar que meus medos e inseguranças o impedissem de alcançar o que ele tanto ansiava! O que tanto precisava!
Não me custaria tanto assim, olhando pelo ângulo positivo da situação. Sair com Robert numa noite qualquer não era como ser condenada à cadeira elétrica, muito pelo contrário. Contudo, o perigo residia justamente aí.
Durante os últimos dias, eu o evitei deliberadamente, porque a última coisa que eu queria, ou melhor: a última coisa de que precisava, era me lembrar de como eu me sentia a cada vez que seus olhos esbarravam em mim. E não importa o quão imatura eu podia parecer com isso, simplesmente era algo que eu não poderia controlar, sob nenhuma hipótese.
Robert era meu ponto fraco. Meus sentimentos me deram o pior calcanhar de Aquiles que eu poderia querer, e isso me dava medo. Talvez fosse estúpido, mas as palavras de Christine estavam sempre ecoando em minha mente, me lembrando de que Robert não era conhecido por seu hall de amizades femininas. Bom, ele não era conhecido por um hall de amizades, definitivamente, e isso era algo em que se pensar, no fim de tudo.
Nervosamente, eu encarei o relógio por demorados segundos, e mordi o lábio de forma apreensiva, pela estúpida constatação de que o tempo estava passando. A princípio, de forma lenta e torturante e, logo em seguida, de forma voraz... e ainda torturante.
Deslizando meus olhos languidamente do relógio para o espelho, analisei meu reflexo brevemente, não querendo encará-lo com tanto afinco, porque aí sim, eu estaria ainda mais descontente comigo mesma do que já estava.
Meus cabelos longos estavam soltos e brilhantes, bem como meus olhos, e cobriam parcialmente a pele exposta do meu ombro. As alças finas do meu vestido preto não eram capazes de fazê-lo e, descendo um pouco mais meu olhar, eu encarei minhas pernas parcialmente nuas, e gemi em desgosto, ao ver tanta pele exposta.
Eu me sentia bonita, pela primeira vez em muito tempo. Talvez pela primeira vez em toda a vida, e a sensação era um misto de prazer e desapontamento. A verdade era que eu gostava de me sentir charmosa, mesmo que minimamente. Saber que, de algum modo eu poderia despertar o interesse de Robert era envaidecedor, em especial quando eu não conseguia me esquecer de que ele já havia me beijado antes.
E que eu o havia afastado, diga-se de passagem.
Cerrei os olhos fortemente e mordi os lábios com o pensamento, agradecida pelo fato de não ter ousado utilizar um batom vermelho, porque isso só tornaria aquele gesto um desastre ainda maior. No entanto, um vento trazendo algum lapso de sinceridade soprou em meus pensamentos, alertando-me de que, na verdade, eu só não queria parecer um caos total sob a hipótese de que Robert resolvesse repetir o gesto da noite em que saímos juntos pela primeira vez!
“Linda! Foco! Isso não tem nada a ver com você, é apenas por Javier! Você está saindo com Robert Blackwell por causa de Javier!” — apontei para mim mesma.
Com toda certeza, eu precisava me concentrar nessa perspectiva, antes que minha sanidade me abandonasse, deixando-me à deriva.
Não tive muito tempo mais para colocar minhas emoções e pensamentos em ordem, pois não tardou para que eu ouvisse o toque insistente do meu celular ecoando pelo quarto. O nome “Robert” dançava na tela à minha frente, e meu coração deu cambalhotas dentro do meu peito. Sua voz rouca me avisou de que ele já havia chegado, e me trouxe a recordação de quando nos encontramos duas noites atrás.
Encontrá-lo naquela noite, sem a menor dúvida, foi uma surpresa! Eu não esperava vê-lo ali, de forma alguma e, suas reações naquela noite não condiziam com nenhuma de suas atitudes anteriores.
Por uma fração de segundo, eu senti como se ele não gostasse da ideia de me ver com Javier, especialmente quando Robert me disse que poderia ser ele no lugar do meu amigo, naquela noite, se eu não o estivesse evitando.
Eu já deveria ter imaginado, depois disso, que sua condição para ajudar Javier seria algo que não me daria mais escapatórias.
— Javier já pode se considerar contratado... — Robert murmurou compassadamente, aumentando a curiosidade que já se apossara de mim, a essa altura. — Se... — frisou. — Você aceitar sair comigo. Não apenas sair... — emendou. — Eu quero que você se sinta à vontade comigo, Linda... que aja de forma tão leve e espontânea quanto estava agindo com Javier. Eu a quero sem reservas. Essa é minha única condição!
Lembro-me de que engoli em seco, naquele exato momento, porque imagens vívidas atravessaram meus pensamentos. Imagens que traziam Robert e eu, numa pista de dança como instantes atrás, eu estava com Javier. As mesmas imagens que ainda me assolavam.
Tristemente, constatei que a sensação de ter meu corpo colado ao de Robert, e suas mãos sobre mim, seria perturbadora, de uma forma que jamais seria possível com Javier. Robert provavelmente me levaria à loucura, e eu não fazia ideia de quanto tempo eu conseguiria aguentar sem render-me a ela, a tal loucura.
Enquanto engolia em seco, direcionando-me à porta de meu apartamento, assumi que eu não estava caminhando a fim de cumprir um acordo que beneficiaria a um amigo. Eu estava fazendo aquilo por mim, por Melinda, porque eu queria passar esse tempo com Robert.
Mas não queria me machucar. Eu precisava ir com cuidado, e não permitir que meus sentimentos controlassem todas as minhas ações. Minha racionalidade não poderia ser deixada à parte, então eu a levaria comigo, também, e esperava que, diante Robert, ela simplesmente não evaporasse.
***
— Você está linda! — Robert murmurou de forma apreciativa, fazendo-me corar.
— Obrigada — agradeci timidamente. — Você está... — eu busquei uma palavra para defini-lo, contudo nada me parecia bom o suficiente. Como eu poderia resumir tudo o que eu estava sentindo naquele momento?... — Maravilhoso! — eu me decidi, sentindo as maçãs do meu rosto se aquecerem ainda mais, provavelmente alcançando um tom de escarlate.
Robert sorriu, e logo em seguida seus dentes prenderam seu lábio inferior, enquanto ele balançava a cabeça de um lado para o outro, provavelmente incrédulo com minha falta de tato.
— Vamos? — convidou.
— Vamos — assenti.
Robert me ofereceu seu braço, para que eu pudesse entrelaçar o meu próprio, e me guiou até sua Mercedes. Eu podia sentir o suor se acumulando nas palmas das minhas mãos, e queria muito poder enxugá-lo. Como se isso fosse erradicar meu nervosismo, ou amainar o ritmo frenético em que meu coração insistia em bater.
Gentilmente, Robert abriu a porta do passageiro para mim e, assim que acomodei-me em meu lugar, ele contornou o carro e fez o mesmo.
— Espero que você se divirta esta noite, Linda — Robert murmurou enquanto guiava a chave até a ignição. — Essa é a ideia original...
— Claro — concordei debilmente. — Vamos nos divertir! — exclamei alegremente, tentando reprimir o pavor que crescia dentro de mim, a cada vez que eu inspirava o cheiro de Robert impregnado naquele veículo.
***
Eu puxei o ar para os meus pulmões, valendo-me de toda a força de que dispunha. Observei bem as paredes em tons pastéis, e a decoração em branco e vermelho. O lugar era aconchegante, acolhedor, e... simples. Algo que eu não esperava vindo de Robert.
Sob que hipótese, ele escolheria algo simples em lugar do sofisticado?
Bom, ele estava comigo, agora, mas isso não seria o mesmo, seria? A verdade era que eu não fazia ideia. Meus pensamentos estavam, de fato, extremamente nublados, afinal, raciocinar não era algo tão fácil, naquele exato momento.
— O que acha? — Robert inquiriu num sussurro, ao pé do meu ouvido. Esse gesto fez com que meu corpo se arrepiasse pelo contato com seu hálito quente.
— É fantástico — murmurei em resposta.
— Fico feliz em saber — admitiu numa leve risada. — Chegamos um pouco cedo, mas a diversão irá começar logo, eu prometo.
Eu apenas concordei com um aceno de cabeça, e Robert me guiou até uma mesa mais afastada. Nós pedimos bebidas — um uísque para ele, e um refrigerante para mim — e então nos pusemos a conversar sobre amenidades.
— Obrigada por ajudar Javier com o novo emprego — agradeci-lhe honestamente.
— Não foi uma atitude tão nobre, assim! — retorquiu com um meio sorriso brincando em seus lábios. — Estou tendo minha recompensa!
Eu bufei incrédula, torcendo o nariz.
— Uma noite dançante comigo — murmurei. — Uma recompensa e tanto! — falei em tom de deboche.
— Foi o que eu quis, certo? Não critique minhas escolhas! — objetou numa falsa reprimenda.
— Ok! — anuí com as palmas das mãos viradas em sua direção. — Sem críticas — concordei.
Nós trocamos mais algumas palavras, até que o ambiente tornou-se um pouco mais movimentado, e Robert finalmente me arrastou até a pista de dança. Os ritmos latinos prevaleciam, e Robert me acompanhou corajosamente por todos eles.
Eu não me considerava uma exímia dançarina, mas havia melhorado consideravelmente desde que Javier e eu começamos a sair e praticar essa arte.
Mas com Robert era diferente, porque ele fazia com que eu me sentisse diferente. A verdade era que meu corpo parecia ter uma vida paralela à vida do meu cérebro, e acabava por não obedecer às suas ordens racionais.
Senti as mãos grandes de Robert apertarem minha cintura, e puxarem meu corpo para mais perto do seu. Minha respiração ficou suspensa por alguns segundos, e eu engoli em seco, tentando manter a calma. Quando por fim puxei uma boa lufada de ar para meus pulmões, o cheiro másculo e amadeirado de Robert invadiu minhas narinas, e minhas pernas bambearam. Por sorte, a essa altura meu corpo já havia encontrado apoio no corpo de Robert, e eu só precisei forçar minhas pernas a me levarem através do ritmo da música.
— Talvez eu não seja um dançarino nato — ele murmurou com seus lábios grudados ao meu ouvido, para fazer-se ouvir apesar da música alta. — Nesse caso, você está no controle.
Seu hálito em contato com minha pele me trouxe um novo arrepio, mas eu tentei deixar minha voz firme e calma, apesar disso.
— Tenho certeza de que você sabe fazer isso — retorqui.
— Sou um bom aluno, pelo menos — ele voltou a sussurrar.
Com um esforço hercúleo, passei meus braços ao redor do pescoço de Robert, a fim de parecer decidida e confiante, o que não era o caso. Forcei meus quadris a se movimentarem no ritmo da música, e senti que Robert fez o mesmo.
Aquilo não poderia ser pior!
Não que ele estivesse fazendo alguma coisa errada, mas eu estava! Como poderia ser possível que, com menos de um minuto com meu corpo colado ao dele, eu estivesse tendo todas essas reações? Era como se não estivéssemos perto o bastante, contudo, uma aproximação maior era impossível, uma vez que desafiava todas as leis da Física!
Minhas mãos queriam escorregar até seus fios de cabelo, para experimentar sua textura e averiguar se eles eram mesmo tão macios ao toque, quanto aparentavam ser. No entanto, eu precisava refrear esse desejo insano, porque...
Bom, havia uma razão, eu tinha certeza, mas quando as mãos de Robert deslizaram suavemente por minhas costas, prendendo meu corpo no meio de seus braços, eu me concedi ao menos o direito de aspirar seu perfume mais bruscamente, e apoiar uma de minhas mãos em sua nuca.
Aquele gesto, por mais simplório que fosse, me causava uma sensação incrível e, tolamente, percebi que vinha reprimindo esse desejo há algum tempo. Provavelmente, todo o nervosismo por trás do fato de estar perto de Robert, era o medo de não conseguir me controlar, e acabar ultrapassando alguns limites. Também havia as palavras de Christine, me dizendo para tomar cuidado, mas eu não conseguia dar atenção a essas palavras, agora.
Graciosamente, Robert afastou seu corpo do meu, para a minha total decepção, e me rodopiou algumas vezes pelo salão, levando-nos para um lugar mais afastado, onde a iluminação era ainda mais baixa.
Uma nova melodia soou pelo lugar, enquanto Robert colava minhas costas a seu peito, e nós assumíamos um novo ritmo.
— Posso perguntar onde você aprendeu a dançar assim? — ele inquiriu numa voz extremamente sedutora, com seus lábios roçando a parte de trás da minha orelha, roubando um arrepio de minha pele.
Era como se eu estivesse prestes a sofrer um ataque cardíaco. Meu coração batia desenfreado, e eu procurei por minha voz durante alguns segundos. Se eu respondesse à sua pergunta na posição em que estava, ele provavelmente não iria me escutar, então, girei minha cabeça para a direita minimamente, o que fez com que meus lábios ficassem à altura de seu queixo.
Os pelos de sua barba por fazer roçaram em minha pele, e foi impossível não me lembrar da noite em que ele me beijou.
— Acho que aprendi sozinha, mas Javier me ajudou a melhorar... — contestei.
Ele sorriu levemente, contra os meus cabelos, e aspirou o ar fortemente.
— Claro — murmurou incrédulo, descendo seus lábios até meu ouvido. —Sempre esse tal de Javier — completou numa voz rouca. Uma vez mais, meu corpo se arrepiou em resposta, e senti meu rosto corar quando Robert passou suas mãos por meus braços nus. — Com frio? — instigou.
Eu forcei a saliva a descer por minha garganta, mesmo com dificuldade.
— M-mais ou menos... — gaguejei.
Apertei os olhos com força, me repreendendo mentalmente por ser tão estúpida a ponto de não conseguir exercer controle sobre minha própria voz. Eu me sentia como uma adolescente, outra vez. Completamente insegura, sem saber nem mesmo como agir.
Sem um aviso prévio, Robert girou meu corpo abruptamente, colocando-nos de frente um para o outro uma vez mais. Suas mãos acariciaram meus braços, parando em meus pulsos e levando-os até seu pescoço. Eu engoli em seco, evitando seu olhar, para logo depois sentir as mãos de Robert deslizarem por minha cintura, continuando seu caminho até descansar nas laterais dos meus quadris.
— Eu não a estou mantendo suficientemente aquecida? — ele murmurou numa voz rouca, com seus lábios roçando a pele sensível do meu pescoço.
Minha coerência estava por um fio, e eu não fazia ideia de como trazê-la de volta para mim. Se ao menos os lábios de Robert não insistissem em manter contato com minha pele, e se esse gesto não a deixasse em chamas!...
Contudo, mesmo contra todas as expectativas, e superando toda e qualquer improbabilidade, Robert e eu estávamos ali. Juntos. Seu corpo estava colado ao meu, suas mãos e lábios em mim, e a sensação era incrível.
Eu o queria.
Sempre quis, na verdade, e não sei como pude sufocar esse desejo até então, mas estava ciente de que agora, eu já não mais exercia controle sobre minhas ações. Quando Robert prendeu o lóbulo da minha orelha entre seus dentes e eu ofeguei, essa constatação apenas tornou-se irrefutável.
De forma involuntária, minhas mãos se enterraram em seus cabelos, e pude perceber que eles eram irresistivelmente suaves ao toque. Robert trouxe seu rosto para junto do meu, e não pude lutar contra o desejo de fitá-lo nos olhos.
Naquele exato instante, eu poderia jurar que meu coração havia falhado uma batida. Os olhos que eu aprendi a amar anos atrás, agora estavam tão próximos dos meus, que cogitei a hipótese de que talvez eu estivesse sonhando.
Mas não estava, porque nenhum sonho, por melhor que fosse, poderia me dar uma visão tão nítida dos olhos de Robert.
E como eles eram lindos! Mesmo com suas pupilas dilatadas roubando parte do espaço outrora ocupado por um verde esplêndido, eles continuavam capazes de me tirar o fôlego.
Minha atenção foi desviada de seus olhos, apenas quando o halito quente de Robert bateu em meu rosto. Fitei seus lábios entreabertos, e acompanhei enquanto eles se aproximavam dos meus lentamente.
A sensação foi diferente da vez anterior. Tão diferente quanto minha receptividade.
Os lábios de Robert contra os meus era algo sublime, e irradiava sensações que percorriam todas as minhas terminações nervosas. Suas mãos pressionaram meus quadris com um pouco mais de força, contudo, quando pensei que ele me beijaria da forma mais arrebatadora possível, senti quando ele sugou meu lábio inferior, para logo após puxá-lo entre seus dentes.
Sua boca estava longe da minha novamente, e não pude evitar a sensação de perda que me assolou.
— Por que essa tortura? — murmurei ainda de olhos fechados, de forma involuntária, surpreendendo a mim mesma não apenas com a pergunta, mas também com a rouquidão em minha voz.
— Estou dando a você a oportunidade de me evitar, como fez na outra noite — sussurrou.
Prontamente, abri meus olhos, encarando Robert fixamente.
Eu conseguiria fazer isso?
Era uma batalha interior, e eu sabia disso. De um lado, havia a Linda racional de toda uma vida, que jamais faria algo de que pudesse se arrepender depois. No entanto, do outro lado havia a Linda apaixonada, que em segredo sonhou com esse momento por anos, e que possuía uma vontade sobre-humana de vê-lo tornando-se realidade.
Mas qual delas era a mais forte?
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