sexta-feira, 14 de agosto de 2015

CD2 - cap 17

Capítulo 17 - Continuidade

This is a state of emergency
Held down for an eternity
Victims, tell me are you listening?
Let's break out of this prison cell
Create stories that world will tell their children
In time we'll be forgiven
(…)
This fight fell at our footsteps
and I swear that the further we get, the closer we are
To finding love in these scars
(Criminals – David Cook)

Jeb

Kyle estava sentado na carroceria do furgão, levantando um pouco de poeira ao empurrar o chão com os calcanhares enquanto esticava as pernas compridas.
                — Tudo bem, amiguinhos. Contem tudo para o Kyle — disse com sua empáfia característica, e Logan olhou de um para o outro como se fosse uma lebre pega numa armadilha.
                — Não tem nada para contar, Kyle. Está tudo bem comigo. Mesmo. Aliás, eu nem sei o porquê disto aqui.
                — “Isto aqui” — Kyle fez um gesto circular com as mãos — é claramente uma intervenção. Está na cara que Jeb acha que tem alguma coisa errada que eu posso ajudar a resolver, não é?
                Eu não sabia bem. Quer dizer, ninguém dava nada pelo garoto, mas a verdade é que Kyle era muito perspicaz e tinha uma mente centrada numa única coisa: o bem do grupo. Eu sempre soube disso. Às vezes ele podia agir com tremenda imaturidade e egoísmo, ou pelo menos era o que parecia para os outros, mas no fundo era só o jeito equivocado dele de enfrentar o desconhecido. Quase sempre. Mas o real motivo de eu ter orquestrado aquela conversa era outro. Claro que eu me preocupava com o estresse pelo qual Logan estava passando, e a amizade inusitada dele com uma pessoa como Kyle, alguém que tinha o poder de trazer à tona um lado mais juvenil no meu amigo de alma pesada, era útil num momento como aquele. No entanto, era na sua praticidade intrínseca e no seu instinto de liderança que eu estava mais interessado. Apesar de todas as crenças em contrário, Kyle podia ser um bom aliado quando se tratava de esclarecer as coisas pelo bem comum.
No grupo único que formávamos agora, havia muito a ser aprendido e ensinado. Diferenças fundamentais entre as duas espécies que o compunham que não poderiam continuar sem ser compreendidas, não quando tínhamos pais potencialmente imortais e filhos humanos, por exemplo. Sem falar em todas as relações que estavam em jogo. Peg, apesar de já conhecer a experiência de perder alguém, tinha agora marido e filho mortais. Sunny tinha Kyle e adotara Trudy e Geoffrey como seus pais; e Estrela, além o amor pela filha e por John, via a todos como seus irmãos. Além delas e de Logan, ainda havia Cal, que não era exatamente “problema” meu, mas era meu amigo também, um amigo com muito a perder.
Para nós humanos a morte é a única certeza, uma em torno da qual moldamos toda a nossa vida. Nosso tempo é finito, por isso precisa contar. É uma espécie de conhecimento inerente que nem o mais jovem dos tolos pode negar por muito tempo. Mas não é assim para eles. Meus novos amigos podiam entender de muitas coisas e podiam caminhar em direção à finitude de seus dias por opção, ou pelo menos podiam acreditar que fariam isso, no entanto eles não sabiam realmente o que significava não ter essa alternativa. Logan fez tudo o que fez para me salvar porque não conseguia se conformar com o que havia de definitivo na minha morte. Sua própria condição deu a ele a ilusão de que podia mudar o imutável.
Tanto para a minha sorte quanto para a dele, o “imutável” daquela vez pôde ser impedido, mas não seria assim para sempre. E o que ele faria se fosse alguém ainda mais importante para ele, como Estrela ou até mesmo Lindsay? Como essas crianças milenares com quem passei a me importar tanto lidariam com as perdas que ainda sofreriam?
Mais perguntas que eu não sabia responder. Havia muitas dessas ultimamente. Mas eu podia adivinhar que todo o seu conhecimento dos mundos além não os prepararia para a mais humana das experiências. E eu iria para o inferno se não tentasse aparar a queda, ao menos um pouco. Por isso a presença de Kyle. Não só porque ele podia ajudar, mas porque ele tinha o direito de se antecipar a uma possível crise. Não era o único, claro, mas não achei mal começar pelo mais improvável aliado. Como eu disse, ele podia ser muito sensato quando queria.  
Quando queria.
— Minha nossa! — protestou Logan. — Não tem nada de errado. E se eu estivesse maluco não ia precisar do Kyle para me deixar mais.
— Há controvérsias...
— Sobre eu não estar maluco ou sobre não precisar de você?
— Sobre não precisar de mim, é óbvio. Não garanto que você não esteja maluco.
— Se o parâmetro for você, estou muito são.  
Que ótimo começo! Eu sei que disse que achava isso bom para Logan, esse tipo de insolência leve e juvenil que Kyle despertava nele, mas essa dancinha duraria o dia todo se eu deixasse e, francamente, estava me faltando paciência.
— Ninguém disse nada sobre maluquice — interferi, antes que a criancice deles me tirasse de vez do sério. — E ninguém precisa estar maluco para precisar de ajuda. Essa sua fala parece um clichê de filme policial.
— É, tipo o Riggs do Máquina Mortífera. Ou o John McClane[1] quando... — Kyle ia prosseguir, mas alguma coisa o parou. Às vezes ele simplesmente sabia quando já era demais. — Tá legal, falando sério agora. Você sabe que eu me importo, não sei por que, mas me importo. E eu não vou te deixar em paz agora que vocês jogaram a isca de que tem alguma coisa mesmo errada. Portanto, desembucha!
— Logan está com estresse pós-traumático — disparei.
— Como é que é? — o próprio Logan perguntou, enquanto os dois me olhavam surpresos.
— É o que Estrela acha, mesmo não tendo certeza, porque não é como se ela pudesse procurar um Confortador, ou sei lá como vocês chamam os médicos de cuca de vocês, mas os pesadelos, a insônia... Ela disse que andou lendo sobre isso em um dos livros do Doc...
— Espera aí, meu pai tinha um amigo que sofreu disso — disse Kyle. — Ele tinha cumprido um turno no Afeganistão há muito tempo, logo quando as coisas estavam piores, e a gente sabia que ele tinha passado por muita coisa lá. Aí, quando veio pra casa, ele tentou voltar para a construção civil, mas os barulhos faziam o cara ter umas reações estranhas. Meu pai disse que ele saía do ar e parecia que ficava revivendo as sensações, como se as coisas ruins estivessem acontecendo de novo.
— Não é isso o que acontece comigo — Logan retrucou. — Eu já disse que são lembranças. Toda vez que alguma coisa importante acontece na minha vida é como um gatilho. Eu sonho com o passado do Logan humano, com memórias que eu não costumava acessar. Algumas são ruins. Mas isso acontece apenas por uns dias, depois passa. Fim.
— A questão não é fato de que vai passar — argumentei —, ou se isso vai acontecer logo ou não. A questão é o que motivou desta vez. Não é possível que você não perceba a diferença.
Todas as coisas que ele mencionou outro dia: a chegada de Estrela em sua vida, a vinda para cá, tornar-se pai... Todos esses eventos foram marcantes o suficiente para despertar lados esquecidos de sua humanidade, mas nenhum deles era traumático. Nenhum trazia com tanta força a lembrança do acontecimento que destruiu o Logan humano e marcou sua personalidade o bastante para moldar o Logan que eu conheço. Ele viu a garotinha morrer e nunca conseguiu lidar com isso de fato. Agora que isso esteve em vias de se repetir comigo, acho que o estrago foi maior do que ele admite. E coisas assim não passam logo e muito menos de vez. Coisas assim voltam para te morder o traseiro quando você acha que elas ficaram para trás. Como relações que você destruiu e que te voltam nas palavras de uma música que esse garoto não poderia conhecer.
— Vocês vão ter que me explicar isso melhor — Kyle se manifestou. — Acho que entendi que você não está dormindo bem porque tem sonhos sobre a vida do seu hospedeiro, mas o que o lance do estresse pós-traumático tem a ver com tudo?
— Não são sonhos, propriamente ditos. São lembranças vívidas — expliquei. — Eu tive algumas enquanto estava me recuperando.
Logan me olhou surpreso. Nunca contei a ele, porque sempre pude adivinhar aquela expressão de ultraje e mortificação em seu rosto. Vulnerabilidade não é algo que um homem goste de ver nos olhos de um amigo e eu teria evitado por muito mais tempo se pudesse, mas não achava mais prudente fazer isso. A gente pode se acostumar a desviar da verdade sempre que ela for incômoda, e então quando ela precisa ser dita tudo parece bem mais difícil.
— A menina — esclareci, me referindo à Lindsay de sua infância. — E o garotinho morto na casa do traficante... Sonhei com essas coisas enquanto estava apagado e sei que você revive tudo como se estivesse acontecendo de novo, porque foi assim comigo. Isso porque eram apenas memórias de segunda mão, por assim dizer. Resquícios de quando sua mente esteve misturada à minha. Então não me venha dizer que não é nada.
— Eu nunca disse que não doía — ele me respondeu em um tom que pareceu ríspido a princípio, mas depois, quando desviou os olhos, percebi que estava apenas desarmado. — Só disse que posso aguentar, que quero me lembrar.
— Quer se lembrar do quê? Vocês vão me dizer do que tudo isso se trata? — exigiu Kyle, e Logan pareceu se resignar.
— O Logan humano não foi uma pessoa feliz. Ele foi uma dessas crianças de lares provisórios e alguns deles foram... Bem, menos do que lares, com certeza. Quando ele era criança tinha uma outra garotinha que ele considerava como irmã, a única pessoa que ele realmente amou na vida. O nome dela era Lindsay.
— Caraca... — Foi o que Kyle conseguiu dizer. Ele ainda não sabia o que tudo isso significava, mas dava para ver que ele estava adivinhando que era algo importante. Então, quando ele não disse mais nada, Logan continuou.
— Eles moravam com pessoas ruins, gente que só estava interessada na pensão que o governo pagava por cada criança e não se importava com elas. O homem era alcoólatra e a mulher estava mais preocupada em fugir dele do que em nos proteger. Um dia, Lindsay ficou doente, mas ninguém fez nada a respeito. Ele tentou cuidar dela, mas era só uma criança, não sabia o que fazer para ajudar de verdade, e a doença piorou até que ele a viu morrer. Perdeu sua irmã porque não pôde contar com as pessoas que deviam zelar por eles. Então ele cresceu sufocando essa dor e nunca mais se permitiu confiar ou se apegar a nenhuma pessoa por muito tempo. Quando sofreu a inserção, eu pude senti-lo ainda por uns momentos, o bastante para entender o que ele sentia em relação aos outros ao seu redor, como não confiava em ninguém. Então, diferente do que aconteceu com alguns que não foram suprimidos de imediato, ele não resistiu. Apenas se deixou ir porque não queria mais viver, não tinha por quê. Eu sabia disso. Senti quando ele se foi e eu fiquei com seus sentimentos hostis e sua dificuldade de apego. Não me lembrei de Lindsay no início. Por muitos anos, na verdade. Até que Estrela apareceu. Depois disso, toda vez que acontece alguma coisa importante é como se alguém acionasse um interruptor em minha cabeça e eu pudesse conhecer um pouco mais dele. E eu quero fazer isso. Quero entender quem ele foi porque eu sinto que me tornei o Logan. Não a Alma, mas alguma coisa entre quem ele era e quem eu passei a ser.
— Merda — Kyle disse. E isso resumiu tudo. Que ótima hora ele escolheu para começar a ser lacônico! Mas justo quando eu estava começando a questionar seriamente minha escolha de envolvê-lo nisso tudo, ele me fez lembrar por que eu tinha apostado em sua capacidade de entender as coisas. — Agora eu sei por que você teve que arriscar todos nós pelo Jeb. Sem ofensa — afirmou olhando para mim. Só balancei a cabeça, garantindo de volta que não eram necessários melindres quando se falava a verdade.
— Sim, eu me lembro. Porque você fez o mesmo por Jodi — Logan respondeu, na sua santa inocência de quem demora a perceber as coisas às vezes. Ultimamente, com ele totalmente fora de órbita, isso se repetia muito.
— Não, idiota! Porque você é aquele moleque. Caramba, você até se referiu a ele e Lindsay como “nós”.
— Bom, de certa forma foi o que eu acabei de dizer, não foi? Eu só não sei como é que isso é importante o suficiente para estarmos tendo esta conversa.
— E como é que não é? Eu não estou falando do presente... Posso apostar que... Cacete! Você tinha que bancar o burro logo agora? Me ajude aqui, Jeb! Antes que eu tenha que quebrar a cabeça dele.
— Você não é como Peg, Logan — tentei explicar. — Ou as outras Almas. Sua natureza é mais... inconformada. Enquanto não conseguir lidar com as questões do passado, corre o risco de sair dos trilhos de novo. Das outras vezes, as coisas que motivaram as ondas de lembranças foram boas. Mas desta vez foi a possibilidade de perder alguém, que é algo que pode acontecer a qualquer momento. Você se nega a entender...
— Isso é um tremendo exagero. Vocês estão me pondo contra a parede pelo que, exatamente? Porque eu me arrisquei para salvar sua vida menos do que Kyle se arriscou quando decidiu buscar a namorada? Menos do que ele já me confessou que se arriscaria de novo?
Não esbocei surpresa. Sempre suspeitei que Kyle fosse impulsivo o bastante para repetir sua imprudência, caso estivesse devidamente motivado. Felizmente, a única pessoa por quem ele faria isso era o pai, e eu tinha certeza de que Ian se encarregara de dissuadi-lo.
— Eu sei exatamente pelo que eu me arriscaria. Se fosse mais burro. Mas você deve ter reparado que eu tenho controle sobre esse impulso específico.
— E eu não tenho?
— Não, não tem. Eu achei que você tinha feito o que fez apenas porque Jeb era importante para você, mas esse não é o único motivo. Você é outra pessoa, outro Logan, mas é tão incapaz de aceitar que não pode salvar o mundo quanto o cara de antes. Como é que você vai perder mais alguém? Como vai passar por aquilo com o que nem nós, humanos de nascença, conseguimos lidar direito? O que vai acontecer da próxima vez em que for a segurança do grupo versus a vida de quem te importa?
—Não vou pôr ninguém em risco. Vou achar um jeito.
— Exatamente. Você vai achar a porra de um jeito. Como eu faria. E aí é que mora o perigo.
— O que vocês sugerem, então? Que se alguma coisa acontecer com Lindsay, com John ou com qualquer outra pessoa que amamos, a gente se sente e espere o fim sem lutar?
— Não, nós sempre vamos lutar. Está no nosso instinto tanto quanto no seu — esclareci. — Sempre achei que o desejo de sobrevivência é comum a todos que vivem, e o de conservação a qualquer um que julgue possuir alguma coisa. Só que nem sempre será possível vencer. Ou sequer espernear. Às vezes, simplesmente não dá. E o que eu estou sugerindo é que quando não houver nada a fazer, a não ser sentar e esperar, você esteja preparado para fazer somente isso.
— Tudo bem — disse Logan, depois de pensar um pouco. — Como é que alguém se prepara para algo assim?
Não era uma provocação, ele não estava retrucando, deu para perceber. Era só uma pergunta honesta que, pensando bem, eu não sabia como responder. Foi quando entendi que a discussão tinha sido cíclica e infértil. E eu que me achava tão esperto, acabei me lembrando que o esperto é sempre o último a perceber o quanto pode ser burro. Eu estava preparado para mostrar a ele o que havia de errado, fazê-lo admitir qual era o problema, mas não como resolvê-lo. Também não era como se nós humanos fôssemos muito capazes de lidar com a questão, não sem dar de cara com esta parede que se estendia diante de nós quando alguém fazia essa pergunta. Foi Kyle quem se saiu com algo parecido com uma resposta:
— Acho que ninguém se prepara. Não faz sentido quando tudo o que se quer é viver ao lado de quem gostamos. Mas eventualmente é preciso aceitar. Talvez seja isso o que a gente estava tentando te dizer.
— E eu ouvi. Cada palavra.
Isso foi tudo o que Logan disse antes de inventar uma desculpa descabida para enfiar a cabeça sob o capô de um dos carros e esquecer-se ali por uns minutos, fingindo que estava trabalhando. A mensagem era clara: ele precisava pensar. Então Kyle e eu fizemos o mesmo, achando maneiras de ocupar nossas mãos enquanto o barulho em nossas cabeças clamava pelo silêncio fora delas.
Para qualquer um que não estivesse ali minutos antes, a conversa pareceria encerrada, não fosse pelas malditas reticências no ar. Já estávamos indo embora quando Logan finalmente as transformou em palavras.
— Eu já pensei muito nisso, na verdade. Sobre Lindsay ficar sozinha.
— Ela não vai ficar sozinha. Não é como se todos nós fôssemos morrer ao mesmo tempo. E nem tão já — ponderou Kyle com a objetividade crua que sempre me fez gostar dele.
— Não foi isso que eu quis dizer. Não exatamente. Você nunca pensou... Nosso mundo é muito pequeno, no final das contas. O nosso mundo mesmo, quero dizer. As cavernas, o deserto, as poucas outras células que conhecemos... Um dia, isso tudo vai acabar com eles, com os mais jovens. De tudo o que construímos, só eles vão sobrar até todos nós termos morrido. E aí tudo vai acabar.
— É cedo para pensar nisso, garoto — afirmei, embora a verdade fosse que quando Lindsay e John nasceram, senti uma esperança insana de que a humanidade pudesse sobreviver à invasão por mais tempo, que talvez, só talvez, eles pudessem arrastar por outra e mais outra geração a herança de quem fomos um dia. Tempo, entretanto, era algo inconsequente de se almejar. O fim é, afinal, o destino de todas as coisas.
— Talvez eles pudessem... Talvez o mundo deles pudesse ser maior que o nosso — disse ele como se não tivesse me ouvido.
Logan falava muito sobre isso, sobre como achava possível que um dia nossas crianças pudessem ser parte da sociedade lá fora. Eu, no entanto, não encorajava essas ideias. Este não era mais um mundo de humanos, essa era outra coisa que ele precisava aceitar.
— Talvez — falei vagamente, na esperança de encerrar o assunto. E fiquei aliviado quando isso pareceu acontecer, embora ainda restassem pensamentos irritantes para pipocar em minha cabeça ao longo do dia.
                Continuidade. Aquele era um tópico que me perturbava, especialmente agora. Nunca achei que eu fosse algo que valesse a pena ser perpetuado. Meus genes, meus valores, minha maneira de ver o mundo. Eu valorizava e tinha orgulho de tudo isso, mas sempre achei arrogância querer distinguir minhas maneiras em outra pessoa. Logan, porém... Às vezes ele me parecia um espelho onde eu me refletia e enxergava mais coisas do que estava preparado para ver. E durante o jantar, horas mais tarde, vi que a obstinação da qual sempre me orgulhei em mim mesmo — e que nele eu gostava de chamar de teimosia — era uma delas.
                — Vou ficar um tempo a mais lá fora — disse, enquanto a atenção dos outros estava dispersa o bastante para nos dar um pouco de privacidade. — Depois que os outros voltarem com os mantimentos que eu reunir para vocês, vou me encontrar com Estrela e Lindsay e nós três... Nós vamos ficar fora. Talvez um mês seja suficiente para o que eu quero fazer.
                — Um mês? Suficiente para quê?
                Eu estava alarmado. Odiava o jeito que Logan tinha de resolver as coisas e depois me comunicar com ar de quem estava pedindo permissão, quando eu sabia perfeitamente que ele já tinha tudo arquitetado e não estava disposto a ser convencido do contrário. Restava saber que droga ele estava planejando agora. Senti a raiva brotando quando comecei a adivinhar que meu sossego estaria definitivamente comprometido depois que ele dissesse o que pretendia, afinal.
                — Vou descobrir como estão as coisas para os humanos lá fora. Quero saber se temos chance de dar a Lindsay e John uma parte de seu mundo de volta.
                Ele só podia estar maluco. Minha garotinha, Estrela e... Ele! Indo embora? Não. Aquilo que eu estava lutando para não admitir, as dúvidas que há semanas começaram a nascer em mim feito ervas daninhas, tudo se juntou para formar em minha mente uma única resolução que não hesitei em comunicar ao meu garoto:
                — Você não está indo a lugar nenhum.



[1] Martin Riggs é o personagem de Mel Gibson nos filmes Máquina Mortífera; e John McClane é interpretado por Bruce Willis nas diversas (e eletrizantes) sequências de Duro de Matar. Ambos têm o hábito de bancar os durões e rejeitar ajuda profissional, mesmo quando muito necessária. Obviamente, eles estão muito bem acompanhados por outros personagens da mesma linha, por isso Jeb diz que é um clichê.

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