Na minha última postagem citei um fato interessante.
Passamos mais tempo com as pessoas do trabalho que com a própria família. Em
alguns casos, eles chegam a ser tornar mais significativos e presentes que nossos
entes queridos.
Não é falta de humanidade essa ocorrência, muito menos uma
priorização distorcida. A verdade é que estamos em uma era que está nos
ensinando a agregar, unir.
Engatinhando como bebês nessa onda milenar de conectividade
e globalização, temos que aprender que tudo faz parte do todo. E claro, antes
de vir o equilíbrio, experimentamos os extremos.
A pouco menos de um século nossa relação era “profunda” com
nossos vizinhos e familiares e extremamente “profissional” com o empregador e
demais funcionários. Hoje a família parece
que está quase esquecida, porque o profissional precisa ser trabalhado,
esculpido, desenvolvido.
Não somos mais aquele profissional estilo Charlie Chaplin
que executa suas funções de forma mecânica. Nossas atividades precisam que
implantemos nossa inteligência e dedicação, buscando a cooperatividade com os
demais colaboradores. Isso enfatiza que não estamos mais segregados
profissionalmente, onde cada setor do serviço executa uma atividade do tipo um
colocar a porca no parafuso, outro aperta a porca, outro pega esse conjunto e
transforma em outra coisa. Sem que haja o menor contato ou retorno do
profissional anterior ou do conseguinte.
Não. Hoje você executa seus deveres e obrigações, atento
aos seus direitos. Preocupando-se com os direitos do terceiro que também tem
deveres e obrigações. E a atividade de ambos não consegue ir para um novo
patamar, sem que haja um feedback do outro.
E óbvio, como não somos robôs, entre uma troca de
informação e outra, existe a conversa trivial, o comentário banal, o relato de
uma situação pessoal. E quando menos se vê o colega vira amigo.
E aí surge o conflito: saber entender que a amizade não
exclui o profissionalismo. E ser profissional não exclui a amizade. Existe uma
grande dificuldade na assimilação dessa linha, que ficou extremamente tênue, e
por que não dizer, invisível.
Embora haja a amizade dentro do trabalho é vital
compreender que o objetivo de todos os colaboradores é executar sua atividade
da forma mais primorosa que for possível. Todos estão ali para contribuir com a
empresa.
Como citou uma amiga minha, nós temos com a empresa uma
relação estritamente comercial. Ela quer seu serviço e por isso ela te paga.
Você quer um salário e por isso trabalha.
É seu dever honrar e ser grato pelo seu serviço e pela
empresa que proporciona seu salário. Afinal, é com essa remuneração que você
sustenta sua família (a família no sentido próprio de ser), conquista seus
sonhos materiais como roupas, sapatos, carro, casa, pagamento de contas, etc.
Como não somos máquinas perfeitas, cometemos erros e
deslizes. Nem sempre nossas atividades serão primorosas e isso pode afetar o
resultado final. Cabe ao seu “amigo”
entender que naquele momento ele precisa ser profissional. É preciso chegar em você apontar o erro cometido. E
você precisa ser profissional e não levar isso para o lado pessoal e ficar
magoado à toa.
Mas infelizmente, antes do equilíbrio, vem os extremos.
Nesse processo de aprendizagem entre conviver mais tempo
com o colega de serviço a ponto dele ser seu amigo e ser profissional a ponto
de receber ou oferecer uma crítica, muita gente está se machucando
violentamente. E o pior de tudo, por falta de maturidade.
Costumo dizer que maturidade é a chave de tudo.
As pessoas não estão tendo maturidade de discernir quando é
o momento de cobrar e quando é o momento de brincar. Se vem uma cobrança para
que algo seja resolvido, modificado e melhorado, muitas vezes ela se ofende,
leva para o lado pessoal. Acham que podem fazer o que bem quer e da forma que
bem entender. E o produto final que a empresa precisa que esteja pronto e com
qualidade para vender aos seus clientes, fica em último plano.
Isso sem contar na falta de respeito ao próximo e pior
ainda, a hierarquia empresarial. Confundem gentileza com permissividade, amistosidade
com libertinagem, generosidade com falta de competência.
Você é gentil? Pronto, ele acha que pode fazer o que bem
entender, na hora que bem quiser. Você o trata de forma amistosa? Se ele for do
outro sexo, vai achar que você no mínimo está dando brecha para uma investida
sexual. Se forem do mesmo sexo, as brincadeiras lembram as festas de Sodoma e
Gomorra. Se você for generoso a ponto de reconhecer o bom profissional que ele
é, enquanto qualidade e princípios morais; ou você está sendo falso e planeja
puxar o tapete dele em algum momento ou você está reconhecendo que não dá conta
do recado tanto quanto ele dá.
A verdade é que os colaboradores entre si e entre seus
chefes estão esquecendo o compromisso maior com a empresa, com suas
responsabilidades. E não estão sabendo aproveitar a amizade forjada no solo
trabalhista para o crescimento pessoal.
Usam uma conquista valiosa como moeda de troca para a
satisfação de seus interesses próprios para não fazer o correto. E quando digo
correto, quero dizer no cumprimento do horário, no cumprimento dos seus
deveres, na busca incessante por fazer o melhor sempre.
Vestem-se com justificativas que me dão arrepio só de
pensar:
“Nós sempre fizemos assim e nunca deu problema”. “Já
fizemos bem pior e nunca houve reclamação”. “Beltrano vai embora todo dia mais
cedo, então eu também posso ir”. “É só um erro, ninguém precisa saber”. “Se os
outros começarem a fazer o certo, daí eu faço também”. “Está tudo errado, mas
não é da minha conta”. “Deixa quieto, dá muito trabalho”. “Amanhã eu faço”.
São tantas satisfações pessoais, que chega a ser tentador
não entrar na onda da maçã podre. E falo por experiência própria, infelizmente.
O pior é que essa onda de privilégios evolui de uma certa
forma que ou você toma as rédeas, afasta-se emocionalmente desse “amigo”,
torna-se antissocial e coloca ordem no barraco; ou você deixa o rio seguir seu
curso, e contamina-se pelos mesmos princípios de tanto faz, tanto fez.
Até que se aprenda com os extremos a ponto de entender,
aceitar e abraçar o equilíbrio entre a amizade e o profissionalismo, há um
grande caminho a percorrer.
Na atual realidade temos que considerar que há pessoas maduras
que sabem ser amigas e profissionais. Há pessoas imaturas que extrapolam o
limite do bom senso. Há as pessoas ingênuas que julgam que todos sabem o limite
entre a amizade e o profissionalismo e acabam sendo afogadas pela imaturidade
dos outros; e há pessoas “maliciosas” que sabem pôr o coleguinha no seu devido lugar
quando as coisas começam a ficar nebulosas. Estas geralmente são pessoas que
tem resposta na ponta da língua. Alguém passou do limite? No segundo seguinte a
resposta é dada e o outro volta a ficar “pianinho”.
Infelizmente, nem todos tem essa destreza invejável. E é
por isso que a opção mais segura acaba sendo o de assumir um ar antissocial na
melhor das hipóteses ou um ar de arrogância, na pior das situações.
Além da maturidade, tem outra coisa que é ainda mais nociva
para a incapacidade de distinguir e usar de forma inteligente a amizade e o
profissionalismo. Sabe o que? O ego!
O ego precisa ser trabalhado. Ele não é ruim, desde que
tenha o tamanho certo. Aquele tamanho que precisa ser para você reconhecer tudo
de bom que está em seu íntimo a ponto de manter uma autoestima saudável, sem se
subestimar ou superestimar e ainda ser capaz de ser humilde e procurar se
remodelar para uma versão melhorada de si mesmo.
Quando o ego cresce demais, você começa a achar que tudo é
com você, de você e para você. Você tem a sensação que a última palavra tem que
ser sua. Que nada funciona sem você. Que você é insubstituível. Que é o único
que sabe fazer e/ou fazer bem. Então você é quem determina quando e se será
feito. E não a empresa que você trabalha ou seu chefe.
Se o ego for pequeno demais, você começa a ser permissivo,
a se inferiorizar, se subestimar. Tudo é sobre o outro, com o outro, para o
outro. Nunca procura melhorar, porque não faz diferença mesmo. Aceita a falta
de compostura alheia. Não questiona para que não julguem sua “ignorância”.
Nunca verbaliza o que você realmente pensa para evitar o conflito. Deixa o
outro fazer o que bem entende, para não perder a amizade. Você só faz se os
outros fizerem primeiro. Por fim, o que o outro pensa de você acaba tendo mais
importância do que a sua contribuição para com o empregador. E Deus te livre de
ser um peixe fora d’água que não brinca igual todo mundo e que ainda por cima
fica cobrando o certo.
Quando um problema profissional ocorre afetando o
serviço/desempenho, seja ele causado pela falta de atenção, pelo cansaço, pela
desmotivação, pelo desinteresse ou pela simples falta de conhecimento; o seu
amigo tem que ser profissional. Vocês
estão ali pela empresa e não pela amizade. A amizade é consequência.
É necessário desmistificar e compreender que chamar a
atenção também é um ato de amizade. Também é um ato de carinho e de cuidado. Ser
permissivo com o errado por medo de afetar a amizade, te torna tão mau profissional
quanto o cara que não aceita se corrigir por que sempre fez daquele jeito ou
porque ele é seu amigo. E poxa! Onde fica a camaradagem?
E se o outro se ofender contigo por conta do certo, fazer o
que? São ossos do ofício. O fato é que não é errado ser amigo do seu colega de
trabalho. Errado é achar ou permitir que ele, você ou ambos, esqueçam o
compromisso maior com a empresa. Errado é ele agir como se você fosse menos
competente por ser gentil. Ou que espere alguma vantagem na amizade
estabelecida.
Agora, se vocês são pessoas inteligentes, sabem que
educação e gentileza são qualidades e não fraquezas, conseguem tratar-se amistosamente
durante o trabalho, compreendem que a cobrança não é pessoal, as brincadeiras
são saudáveis e não uma representação de orgia, buscam melhorar sempre e que a
humildade não é sinal de incompetência; parabéns. Vocês entenderam tudo sobre o
equilíbrio.
Caso contrário, você é só um oportunista. E está longe de
ser um profissional.
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