Capítulo 3 – Mãe
Lived a life
so endlessly
Saw beyond
what others see
I tried to
heal your broken heart
With all that
I could
(…)
Plans of what
our futures hold
Foolish lies
of growing old
It seems
we're so invincible
The truth is
so cold
(...)
Sleep tight,
I'm not afraid
The ones that
we love are here with me
Lay away a
place for me
'Cause as
soon as I'm done I'll be on my way
To live
eternally
(So Far Away – Avenged Sevenfold)
É solitário ser quem eu sou. O mundo para mim se torna um lugar deserto mais
ou menos a cada dez anos, quando sou obrigada a romper todos os meus laços para
sempre. E depois reconstruí-los em outro lugar.
Dentre os seres humanos comuns, ninguém realmente me conhece e, por causa
disso, não há ninguém que possa me amar pelo que realmente sou. A única pessoa
que sabia quem eu era de verdade era minha mãe, mas ela se foi há muitos anos.
É um processo natural na vida dos filhos, pelo menos daqueles que não morrem
antes da hora. Eu deveria já ter me conformado, portanto. Porém, não há nada de
natural em perder alguém que é todo o seu mundo, a única parcela de amor que é
reservada somente a você na Terra.
Mas, a despeito dessa dor que às vezes me incapacita, eu sou grata por
ela ter existido, grata pela lembrança que me move. É por ela que eu faço o que
faço. Não porque acredite piamente na nobreza de minha missão, mas porque ela acreditava. Minha mãe sacrificou boa
parte de sua vida, passando pelo processo dos dolorosos rompimentos, sabendo
que não teria netos, que não me veria envelhecer, que eu não seria
verdadeiramente amada por ninguém enquanto aceitasse minha missão. Ainda assim,
ela acreditava nisso. Mais do que eu, ela sabia o que era preciso fazer.
Tudo começou para nós numa tarde de domingo, quando eu tinha dezesseis
anos. Eu sempre tinha sido estranha, por isso nunca me questionei sobre as
coisas que sentia. Parecia normal para mim. Então, quando durante o almoço, eu
me levantei da mesa sem dar explicações à minha mãe, saí de casa e impedi que o
filho do vizinho pegasse seu carrinho de rolimã e entrasse com ele na frente de
um caminhão em movimento, não pareceu nada diferente de uma tarde normal para
mim. Mas minha mãe, que me observava paralisada no jardim de entrada de nossa
pequena casa, não achou a mesma coisa.
— Como você sabia? — ela perguntou.
— Eu simplesmente sabia — respondi.
—Como isso é possível? É como se o anjo da guarda desse menino tivesse
soprado em seu ouvido. — continuou ela, admirada.
— É quase isso.
O interrogatório continuou tarde afora, até que minha mãe finalmente
entendesse o que se passava comigo. Aquilo sempre tinha estado ali, mas ela
simplesmente nunca tinha prestado atenção. E ficou maravilhada em finalmente
perceber. Ela amava o fato de ter posto “algo realmente especial” no mundo.
Então, por causa dela, acima de qualquer outra coisa, eu continuava,
porque eu sentia que era isso que me fazia especial aos olhos dela, mesmo que
esses olhos agora só vivam na minha cabeça, imateriais e eternos, esperando
pelo dia em que eu não aguente mais.
Sim, eu sei que não era por isso que ela me amava. Sei que ela me amaria
de qualquer maneira. Eu era sua filha, afinal. Sua única filha. Mas eu não
queria decepcioná-la. Além disso, embora houvesse dias em que eu realmente não
conseguisse ouvir o que Meu Pai queria de mim, minha solidão falando mais alto
do que qualquer outra coisa, havia outros em que eu simplesmente amava quem eu
era.
Como no dia em que, há vinte anos, durante uma noite chuvosa, eu soube
que tinha que ir até um ponto de ônibus pelo qual normalmente não passava. E
lá, desamparada e sozinha, encontrei aquela que eu amaria como se fosse minha
família.
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