Capítulo 18 – Voto
Vencido
What has happened to
it all?
Crazy, some say
Where is the life that
I recognize?
Gone away
But I won't cry for
yesterday
There's an ordinary
world
Somehow I have to find
And as I try to make
my way
To the ordinary world
I will learn to
survive
(Ordinary World – Duran Duran)
Logan
Era
para ser uma incursão como todas as outras. Sunny e Kyle percorreriam com o
furgão as cidades programadas para eles e eu cobriria as distâncias maiores com
o Mustang, buscando coisas mais fáceis de acomodar, como roupas, ou mais
difíceis de conseguir, como medicamentos. Então eu me encontraria com eles no
meio do caminho para passar tudo para o furgão antes de carregar meu
porta-malas novamente em outra cidade.
Por fim, todos nós nos encontraríamos com Jared e Mel que, com o
caminhão, levariam parte da carga para podermos lotar nossos veículos de
mantimentos mais uma vez antes de voltarmos todos para casa, separadamente para
não levantar suspeitas.
Nossa equipe
estaria desfalcada desta vez. Estrela, Peregrina e Ian só nos acompanhavam
quando levávamos as crianças e decidimos que, nessas ocasiões, a prioridade
deveria ser nossos filhos, não o quão rápido conseguiríamos encher um caminhão
de comida. Porém já fazia um tempo que não viajámos e nossas reservas estavam
se esgotando, de modo que seria preciso nos focar nas “compras”, fazendo uma
incursão mais rápida e eficiente. Por isso eles ficariam em casa enquanto eu me
concentrava em fazer o que devia — encher nossas despensas de comida — para
poder voltar logo para minha família.
Estrela não
estava contente com essa resolução, no entanto. Ela estava preocupada comigo e
só se convenceu a me deixar ir quando aceitei tomar doses reduzidas de “Dormir”
durante as noites em que estivesse fora, para evitar que a insônia atrapalhasse
a viagem. Estive me negando a fazer isso porque não queria gastar nosso único
frasco restante, mas agora que eu estava indo conseguir outros não havia
problema.
— E leve o
“Acordar” também. Se você se sentir sonolento durante o dia, uma dose do
aplicador menor vai te manter alerta. É melhor garantir — ela me disse quando
estávamos arrumando minhas coisas. Para qualquer Alma normal, o conhecimento
sobre as potencialidades dos medicamentos era bastante básico, mas, como
Curandeira, Estrela conhecia as nuances dos efeitos como ninguém.
— Pensei que
usando apenas a dose mínima de “Dorm’ir” eu não teria problemas em acordar por
mim mesmo.
— É melhor
garantir — ela repetiu, e percebi por seu tom de voz o quanto ela estava
realmente apreensiva. Imediatamente, fiquei irritado comigo mesmo. Tudo o que
eu não queria ela ter dado motivos para que ela se sentisse assim. Era preciso
tranquilizá-la.
Enlacei sua
cintura por trás e puxei-a contra mim, sentindo seu corpo tenso relaxar apenas
um pouco em meus braços. Ela sempre ficava um pouco inquieta quando tínhamos
que nos separar, mas desta vez estava pior.
— Eu não estou
doente, amor — garanti em seu ouvido, beijando seu pescoço nos pontos certos
que a faziam se arrepiar. — E sei me cuidar muito bem sozinho, sempre soube.
Não precisa ficar assim tão preocupada comigo.
Estrela sempre
teve o instinto de cuidar das pessoas ao seu redor. No corpo da Curandeira,
essa característica apenas se intensificou. Eu realmente gostaria que ela não
se preocupasse tanto, apenas pelo fato de que sempre quis poupá-la de qualquer
tipo de angústia. Mas quem era eu para censurar seus instintos quando os meus
comandavam tanto minhas ações? Então, apesar de tudo, eu entendia. Só precisava
encontrar uma maneira de fazê-la se lembrar de que podia confiar no meu
discernimento.
— Prometo a
você que vou ficar bem — me limitei a dizer, sabendo que, embora para alguns
tal promessa parecesse vazia, não era pouco para ela.
Apertei meus
braços em torno de seu corpo mais um pouco, infiltrando minhas mãos sob a blusa
e deixando que nossa pele se comunicasse através do calor que transmitíamos um
ao outro. Eu nunca deixaria de me surpreender com o quanto aquela pele era
macia. Meus dedos quase não a mereciam. Inspirei seu cheiro, me perdendo nele
por um instante, e a senti relaxar um pouco mais. Ela tombou a cabeça para o
lado para me dar maior acesso, uma de suas mãos deslizou sobre as minhas
enquanto a outra se infiltrou em meus cabelos, puxando-me sutilmente de volta
para si. Entendi a sugestão e voltei a beijá-la. Nuca, pescoço, ombros... Eu
podia continuar a noite toda se ela quisesse.
— Eu sei que
você vai ficar bem. Confio em você. Desculpe se pareci meio neurótica — ela
falou, virando-se para mim.
— Tudo bem,
você só estava preocupada.
— É que eu
entendo o que Jeb e Kyle quiseram te dizer. Entendo por que eles acharam que
deviam nos falar sobre isso. Fiquei imaginando você sozinho no carro, o sono te
vencendo e... — Seus olhos, que até então encaravam os meus, baixaram. Estrela
balançou a cabeça de um lado para o outro como se quisesse se livrar de um
pensamento e a intensidade da tristeza que esse gesto continha me assustou. — Eu
não pensava em possibilidades como essa antes, mas agora, depois da decisão que
tomamos em permanecer com os humanos, em envelhecer com eles e com nossa filha,
é preciso passar a considerar nossa fragilidade e acho que minha mente está
começando a fazer isso... Depois do que passamos, ficou real demais e só de
pensar na possibilidade de perder você...
Suas palavras
eram velozes e pareciam ao mesmo tempo surpreendê-la e feri-la enquanto eram
expulsas de seu peito. De repente, aquilo foi demais para mim e calei-a com um
beijo. Não queria ter que pensar nas coisas naqueles termos. Na verdade, não
estava preparado. Talvez os outros tivessem mesmo razão quando diziam que eu
tinha cicatrizes sensíveis demais para serem tocadas. Esmaguei os lábios dela
com os meus, desejando que pudéssemos nos agarrar um ao outro sempre, que o ar
que eu roubava de sua boca quente fosse a solução para qualquer perplexidade que
minha mente não pudesse decifrar, o impulso de coragem que dominaria qualquer
hesitação. E de certa forma, acho que era mesmo.
— Você não vai
me perder — prometi, sem me importar com o quanto aquilo podia ser imprudente.
Para mim era
verdade.
Eu não sabia o
que acontecia depois, quando o corpo se extinguia e não havia mais um lugar
físico para ir. Mas estava convencido de que, o que quer que acontecesse, se
houvesse um lugar, um Paraíso ou algo parecido com o que os humanos
acreditavam, Estrela estaria nele. E eu faria tudo para estar com ela.
— Escute,
amor, vivemos neste mundo que ainda não entendemos completamente. Aqui não há
garantias, estabilidade, nada a que nos agarrarmos. E você sabe o quanto isso
me deixa louco às vezes — brinquei, e ela riu, mesmo que no fundo não fosse bem
uma piada. —Mas sempre se pode acreditar em alguma coisa, e eu escolho
acreditar no que sinto por você. Seja como for, onde for, de qualquer maneira, estarei
segurando sua mão até o fim. Ou depois dele se puder. Eu não ligo, nada nem
ninguém vai me fazer soltar.
— Promete? —
Ela sorriu.
— Prometo.
Então ela me
beijou. Não para cessar minhas palavras, como eu tinha feito antes. Ou para
capturar um pouco de vida, como eu tinha feito sempre. Mas para me prometer
também, para me assegurar. Como ela fazia todas as vezes em que eu precisava
tocar o abstrato que, para mim, se concretizava apenas nela.
— Olhe só para
nós — ela disse, aninhando a cabeça em meu peito, meu queixo apoiado em seus
cabelos. — Fazendo promessas sobre o incontrolável futuro quando mal sabemos
lidar com o presente. Como dois bons humanos.
— Quem disse
que somos casos perdidos? — brinquei, e o ar de seu riso aqueceu o tecido de
minha blusa. Quando ela ficava tão perto assim, quando se permitia descansar em
meu abraço dessa maneira, era sinal de que estava deixando seus medos irem
embora.
— Mesmo assim,
você ainda nem foi e já não vejo a hora de você voltar.
— Eu também,
mas é só por alguns dias. A não ser que...
O começo de
uma ideia me escapou, mas eu não soube como continuá-la. Nunca fui o tipo de
pessoa que diz coisas sem pensar. Em geral, toda vez que verbalizo algo é
porque a ideia já deu a volta completa em meu cérebro e visitou todos os
lugares em que poderia ressoar. No entanto, eu não andava no meu normal e
aquela ideia semiformulada estava deslizando por entre as brechas do meu senso
crítico.
— A não ser
que o quê? — Estrela perguntou. E quando não respondi de imediato, ela se
afastou um pouco para me olhar nos olhos. — Sua expressão está estranha.
— É que... Todas
aquelas vezes em que conversamos com Peg e Ian sobre as crianças, nossas idas
lá fora com eles... Eu não quero mais ir devagar nas nossas tentativas de
entender como seria a vida de nossos filhos fora daqui. Talvez um dia seja a
única vida que lhes reste. Se houver uma chance de integração para eles, se
houver esperanças, quero que estejam preparados.
— Aonde você
está querendo chegar?
— Nós podíamos
voltar. Seria seguro para Lindsay ao nosso lado.
— Voltar? — Os
olhos dela se arregalaram. — Do que você está falando? Nós não podemos voltar.
Ian não pode ir e eu não vou ficar longe de Peg e John...
— Calma! Eu
também não quero ficar longe deles. Nem pretendo. Que sentido teria depois de
tudo o que passamos? É só por um tempo, para conhecermos outras Almas, quem
sabe outros pais com filhos humanos, sondarmos o que estão pensando.
Eu sabia que
parecia loucura, mas não era. Talvez sacrificássemos um tempo ao lado daqueles que
amávamos, mas se fôssemos aos lugares certos e fizéssemos as perguntas certas
poderíamos sonhar com um futuro com algumas garantias. Nunca tivemos dúvidas de
que deveríamos conservar nossos filhos humanos, não era possível que outros não
sentissem o mesmo.
— Quanto
tempo? — ela perguntou. Aquele era um ponto sensível para nós, eu sabia que
Estrela seria razoável ao considerá-lo. Assim como tinha certeza de que Peg e
Ian nos apoiariam, mesmo que algo assim trouxesse uma dose imensa de
insegurança depois de tudo que já vivemos.
— Só o
suficiente, com certeza. Nem um minuto a mais. Algumas semanas apenas.
— Tudo bem. Se
você vai fazer isso, estou indo com você.
********
— Você não
está indo a lugar nenhum. — Foi o que Jeb decretou secamente quando, mais tarde,
durante o jantar, falei com ele sobre meu plano.
Eu não
esperava aprovação imediata, sabia que ele reagiria com desconfiança num
primeiro momento, mas tanta veemência me surpreendeu.
— E posso
saber por quê? — “Não é como se fôssemos prisioneiros aqui”, tive vontade de
dizer, mas não quis soar desrespeitoso ou ingrato. Eu não tinha me esquecido do
quanto significou para nós sermos acolhidos neste lugar. Jamais seria tolo o
bastante para isso, não importava o quão irritantes suas reações autoritárias
pudessem ser às vezes. Como agora.
— Porque eu
não quero — ele disse severamente, mas nestas alturas todos tinham voltado suas
atenções para nós e isso o obrigou a um tom de voz mais recomposto. — É
perigoso.
— Não, não é.
E você sabe disso. Que história é essa, afinal?
— Para
Lindsay. Seria perigoso para Lindsay. Ela pode falar com eles.
— Falá o que,
vovô? — Lindsay perguntou do colo da mãe.
— Nada,
docinho — Estrela respondeu. — O vovô tem medo que você conte a alguém na
cidade onde fica nosso castelo, mas você sabe que não podemos falar, não é?
Senão a mágica acaba.
— Uhum — ela
confirmou, assentindo com a cabecinha. — Não fica com medo, vovô. A gente vai
passeá, mamãe?
— Estamos
pensando. Que tal irmos brincar lá na sala principal, Lindy? John vai com a
gente, né, tia Peg?
— Claro — Peg
concordou, deixando que Estrela levasse as crianças para longe da conversa
tensa. Por fim, quando os gritinhos dos dois podiam ser ouvidos ecoando a certa
distância, ela me questionou: — O que você tem em mente, Logan?
— É, do que
estamos falando aqui? — emendou Ian.
— Estou
falando de passar um tempo lá fora para descobrir aquilo sobre o que temos nos
perguntado tanto nos últimos tempos. Como as Almas estão lidando com as
crianças humanas que certamente existem por aí. Se há um plano para elas em que
nossos filhos possam se encaixar no futuro.
Notei que
Lucina estava mais atenta agora. E até mesmo quem não tinha interesse nisso
estava prestando atenção. De certa forma, era algo que podia mudar tudo para
alguns humanos, e todos eram capazes de apreciar essa possibilidade.
— Eu sabia que
era questão de tempo até você tentar algo assim — disse Jared. — Tem certeza de
que não é mesmo perigoso para nós?
— Tenho. Eu
sei que vocês têm dificuldade em acreditar nisso, e compreendo bem por que, mas
buscadores são diferentes de policiais. Ninguém de nossa antiga vida
suspeitaria do álibi que criamos, então não há ninguém procurando pelo Buscador
Logan ou pela Curandeira Águas Claras. E mesmo que estivessem, no momento em
que nos registrarmos em outra cidade com novas identidades ninguém vai
pesquisar sobre nós, cavar nosso passado ou tentar descobrir onde estivemos.
Não é como se houvesse uma checagem de antecedentes, entende? Ninguém tem
motivos para duvidar de que somos apenas uma família nova se mudando para uma
cidade nova.
— Que seria?
— Longe o
bastante de vocês. Vou tentar me infiltrar num dos Conselhos.
— Eu me lembro
— disse Mel. — Você já tinha nos explicado que existe um em cada grande
capital, não é? Como se fossem legisladores.
— Sim, mais ou
menos isso, mas não é nada impositivo ou arbitrário. Eles apenas dedicam seu
tempo a estudar a comunidade para ter uma ideia melhor de suas necessidades e
poder nos ajudar a organizar seu funcionamento.
— Mas como é
que você vai se infiltrar em algo assim? — questionou Lily, pronunciando-se
pela primeira vez. — Não parece que seja para qualquer um.
— Na verdade,
é. O Conselho é composto por voluntários. E do nosso ponto de vista, não é um
trabalho mais especial do que os outros. Tudo o que fazemos é em benefício do
bem comum, então é mais uma responsabilidade do que uma honra que mereça
destaque.
— Se nossos
políticos tivessem tal mentalidade, nossa história teria sido completamente
diferente — refletiu Doc. — Seria mesmo ilusão imaginar que uma sociedade que
funciona tão perfeitamente quanto a de vocês não tivesse castas.
— “Castas” é
uma palavra forte, Doc. Não acho que a conotação ruim seja apropriada — rebati.
— Uma colmeia
então — retificou. — Se assim for, realmente não há problema. No entanto, me
pergunto sobre um risco mais simples que você teima em ignorar. Jeb tem razão
quanto a Lindsay. Ela é uma criança, não há como controlar o que ela pode
falar.
— Mas o que
ela sabe? — Ian veio em minha defesa. — Ela não saberia apontar nossa
localização nem mesmo se... — Eu sabia o que ele queria dizer e fui grato pela
hesitação. Devia ser algo difícil para ele tanto quanto para mim, mas
precisávamos colocar todas as cartas na mesa naquele momento.
— Nem mesmo se
ela sofresse uma inserção — completei, apesar do mal estar que a simples menção
da palavra trazia. Para mim, era como um torno apertando minhas têmporas. — Ela
é jovem demais para que qualquer informação possa ser retirada de sua
cabecinha. Quanto ao que ela pode dizer, que tem uma família grande que mora no
deserto... Podemos contornar tudo para que não passem de tios e primos de
alguma cidadezinha aqui do Arizona, ou até mesmo no Novo México, quem sabe até
Nevada.
— Qual é a
pegadinha? Se era tão simples assim, porque você não tentou isso antes?
Essa era
Maggie. Mesmo que não me tratasse mais como inimigo, ainda agia como se todas
as minhas ações tivessem motivações duvidosas por trás. Olhei para Jeb em busca
do auxílio costumeiro, já que ela tendia a ser menos agressiva quando quem
argumentava era ele, mas tudo o que encontrei foi silêncio absoluto e uma
expressão que, embora eu não soubesse identificar com certeza, se parecia muito
com aborrecimento.
— Eu não
chamaria de simples, Magnólia. Envolve um fingimento muito elaborado da minha
parte e de Estrela. Sem contar no quanto será sofrido para Lindsay ficar longe
de vocês. Para nós também não será agradável. Nem um pouco. Mas acho que pelo
bem das crianças, precisa ser feito.
— Você acha
mesmo que as crianças têm uma chance? Todas
elas? — Lucina perguntou, e Lacey, em silêncio até então, soltou uma risada de
desdém que optamos por ignorar, mas que deve ter machucado as esperanças da
mulher que me olhava numa expectativa cada vez mais insegura. — Talvez meus filhos... Talvez vocês pudessem
fingir... Isto é, se o que você imagina se confirmar mesmo. Há uma chance?
Levei a sério
a pergunta. Lucina não nutria mais ressentimentos pelas Almas com quem
convivia, mas de todos nós era de mim que ela mais comumente se esquivava.
Talvez por medo, não sei, mas o fato é que ela nunca falava comigo se pudesse
evitar, então eu sabia que aquelas palavras significavam muito para ela. Eu não
podia responder suas perguntas com menos do que sinceridade absoluta.
— Quando a
colonização aconteceu, eles já eram nascidos. Ninguém acreditaria, portanto,
que eles são meus filhos ou de alguma das garotas. — A decepção nos olhos dela
foi terrível. Como pai, minha empatia por ela era ainda maior. Mesmo assim, não
consegui mentir. — Sinto muito, Lucina. Talvez daqui a alguns anos seja mais
fácil fingir que eles são mais jovens...
— Não daria
certo — ela me interrompeu com pesar. — A menos que um de vocês também fosse
negro.
— Pensaremos
em alguma coisa quando chegar a hora. — De repente, passei a sentir uma
necessidade urgente de acabar com a dor dela, de dar a aquelas crianças que me
olhavam com expectativa algum fio de esperança. — Já fizemos coisas mais
difíceis.
Lucina me
olhou nos olhos, acho que pela primeira vez, e sua expressão trazia um misto de
compaixão e resiliência quando ela colocou a mão sobre a minha.
— Você deve
ir, Logan. Pelos filhos de vocês. Eu faria qualquer coisa pelos meus se tivesse
a chance. Ninguém me impediria. Então você precisa ir e fazer tudo o que puder.
— Você não
está bem — Jeb interferiu finalmente. — Não se faz uma jogada desse porte se
não estiver no seu melhor.
Não achei que
ele fosse falar algo assim na frente de todos, já que meus problemas — como ele
e Estrela teimavam em classificar — não eram de conhecimento geral.
Provavelmente por isso ele tinha se segurado até então, mas eu devia saber que
era o que ele queria dizer desde o início. Mesmo assim, ouvi-lo me desarmou.
Era quase egoísta de minha parte, mas a preocupação excessiva dele não era bem
o incômodo que em outros tempos eu consideraria. Ao contrário, era
reconfortante saber que alguém se preocupava comigo. E então, ao mesmo tempo,
percebi que não queria que ele se sentisse aflito por nada.
— A insônia? —
falei, tentando esclarecer os outros sem entrar em detalhes. — Eu estou bem.
Estou me sentindo melhor de verdade e Estrela estará comigo, administrando a
cota certa de Dormir caso seja necessário.
— O Logan sabe
se cuidar, tio Jeb — Jamie se pronunciou. — Eu sei que estamos seguros e sou
muito grato por isso. Muito mesmo. Mas já é ruim o suficiente que tenhamos que
ficar aqui para sempre. Quero pensar que meus sobrinhos poderiam ter uma chance
melhor.
Jamie não
falava sério com frequência. Talvez fosse típico da idade, ou mais
provavelmente um atributo de sua personalidade alegre, mas ele conservava
aquele ar meio inconsequente de quem sabe que não precisa se preocupar com
coisas difíceis até que elas batam em sua porta. Entretanto havia este lado
nele, uma maturidade forjada na simplicidade realista de seu caráter, algo
imposto pelas durezas da vida e que ninguém conseguia ignorar quando ele
extravasava.
— Acho que é
muito simples — ele retomou. — Se não ameaça nossa segurança, não devemos
interferir na sua decisão com Estrela. Ao contrário de nós, vocês podem ir e
vir quando quiserem, então... Também não é como se a Lindsay nunca tivesse
saído antes e fosse ficar tagarelando por aí. Ela nem conhece tantas palavras
assim. Aposto que as Almas não vão nem entender a língua enrolada de bebê dela.
Então, tão
inesperadamente quanto tudo que dizia respeito às ações de Jamie, seu jeito de
sempre estava de volta, e a atmosfera tinha perdido o clima de expectativa
tensa. Era como se tudo já estivesse resolvido, dava para ver nos rostos das
pessoas. Eu me considerava bom com as palavras, mas aquele garoto tinha uma
habilidade inata que eu quase invejava.
Olhei para Jeb
em expectativa. Minha decisão não dependia dele, por mais insolente que pudesse
parecer, ela já estava tomada antes desta conversa. Mesmo assim eu me importava
com sua resposta.
— Parece que sou
voto vencido então — disse, mantendo aquela expressão neutra tão característica
dele. — Acho que vou ter que confiar mais uma vez em você. Vamos lá, vamos
acertar os detalhes com calma.
Eu não sabia que
ficaria tão aliviado. Nem que pareceria tão difícil acreditar na confiança que
ele me depositava. Jeb nunca mentiu para mim e nem tinha razões para fazê-lo
agora, mas muitas coisas andavam estranhas ultimamente. Estava claro que ele
ainda tinha objeções, eu só não sabia explicar quais. Se ele realmente achasse
que eu estava sendo imprudente, já teria encontrado uma maneira de me
dissuadir, no entanto não o fez. Não dava para saber o que isso significava sem
perguntar a ele e era o que eu pretendia fazer mais tarde.
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