sexta-feira, 12 de abril de 2013

OLDM – Capítulo 1




Prólogo

Charlie era um anjo da guarda. E como tal, ele fora destinado a um espírito desde o dia de sua concepção. Já no espaço — terra de ninguém, nem do céu e nem do inferno, e de nenhum tormento ou penúria e que de nada tem haver com o dito espaço sideral — Charlie se viu incumbido de guiar e orientar sua pupila: Luz De Ternura.
Luz De Ternura desde o dia de sua criação como espírito, sem carne em que se fixar, já se mostrava doce e gentil. Sempre tinha uma dúvida, uma curiosidade insaciável, uma ternura inigualável que permitiam que ela aprendesse e respeitasse tudo muito rapidamente. Era de encher os olhos tanto de seu criador quanto de seu anjo protetor.
Séculos mais tarde, quando Luz De Ternura foi destinada a um corpo, uma matéria física que como seu espírito também tinha a vitalidade feminina, Charlie a seguiu cegamente para continuar seu dever de orientar e ajudar, agora que ela assumiria o caráter humano tão cheio de inconstâncias emocionais e arrebatamentos sensoriais.
Assim que Luz De Ternura abriu seus olhos para o mundo e fora acolhida por seus pais, ela ganhou um novo nome; passara a se chamar Renée. O bebê tinha a pele alva dos recém-nascidos e os olhos num tom de azul cinzento que mais tarde se tornaria azul-esverdeados.
Como o espírito que na carne habitava, Renée se desenvolveu afoita de aprendizagem, gentil como um anjo querubim e linda como nunca antes vistas. Charlie acompanhou os crescimento da jovem e ao contrário ao que se manda as regras, ele nunca se manteve oculto a ela.
Quando a jovem alcançou a adolescência e fora arrebatada pelos hormônios juvenis, foi com grande penúria e por um sentimento desconhecido que Charlie guiou seus atos. Era incompreensível para ele o sentimento que o atormentava cada vez que ele via sua pupila ser cortejada por um cavalheiro; sentimento esse que fora multiplicado em um batalhão quando ela começou a corresponder certa investida aos vinte anos de idade.
Quando a sós, Charlie deixava claro seu descontento e ainda mais claro o sentimento que o sufocava e que ele não sabia nomear, mas sua pupila, sim.
— Está com ciúmes. — Afirmara Renée numa tarde, conversando com seu anjo da guarda debaixo de uma árvore.
— Que é isso? Que é ciúmes? — Charlie perguntou ingenuamente.
— É esse sentimento que você sente. Parece raiva, mas não é. Tem uma pontada de raiva, que sempre se dissipa dando lugar ao desejo. Desejo esse que se mescla com o sentimento de posse e por consequência, de traição.
Charlie não negou, porque o sentimento fora perfeitamente descrito por sua pupila.
— E porque sinto isso? — Perguntou para si mesmo, meditando em seu interior uma resposta convincente.
Renée respondeu a ele de forma doce.
— É porque você me ama e me quer só para ti. — Charlie a olhou espantado. — Quer ocupar o lugar que um cavalheiro ocupa ao lado de uma dama, trocando amor e carícias.
Ao ouvir as palavras tudo se encaixava, mas parecia tão horrível isso, porque lhe soava como algo proibido e contra a mão natural da ordem das coisas.
— Eu não posso te querer só para mim. É errado. Você tem que seguir seu caminho. — Charlie continuou seu murmúrio, só para si. Renée escutara tudo e se entristeceu.
— Eu não acho que seja errado. Também te amo e também te quero só para mim. Quando aceitei as investidas de Phill... — Renée balançou a cabeça e não concluiu seu pensamento. Olhou para o lado oposto de seu anjo por um longo tempo. Quando voltou a falar, sua voz não passava de um sussurro. — Como pode ser errado se nos amamos? Onde há amor, não há errado ou proibido.
Charlie estava atormentado, e pela primeira vez desde que Luz De Ternura encarnara num corpo, ele se afastou dela.
— Preciso ir. — Disse simplesmente.
Renée acompanhou seu anjo da guarda se levantar ao seu lado e se preparar para alçar voo. Charlie era um homem belo que aparentava ter seus trinta anos. Os cabelos negros impecáveis era penteado para frente lhe dando um ar juvenil. As sobrancelhas grossas, o nariz reto, os molares salientes, a pele argêntea e a altura imponente lhe davam a beleza que fariam qualquer moça suspirar de desejo.
Charlie deixou suas asas se abrirem, revelando penas feitas de luz brilhante e pura, quase ofuscante. Em apenas um bater de asas, ele se resumiu a um minúsculo ponto de luz e sumiu.
Renée relutou em deixar o lugar, esperando que ele voltasse. Quando uma hora se passou, ela percebeu que não ocorreria e triste, se recolheu para a casa de seus pais. Seus pais até indagaram a tristeza da jovem, mas há muitos anos, Renée tinha aprendido que dizer que conversava com seu anjo da guarda não era lá visto como algo mentalmente saudável. Quando a menina tinha doze anos e ainda insistia no assunto, seus pais até cogitaram uma internação. Orientada por Charlie, Renée aprendeu a se calar e quando indagada, aprendeu a responder:
“Estava conversando com meus botões.”
Ao que parecia, para a maioria, era muito mais saudável dizer que estava falando sozinha que revelar que estava conversando com um ser mítico, mesmo que este fosse o símbolo da Igreja Católica. Nem mesmo dizer que estava rezando em voz alta, funcionava. Aos olhos de muitos e até mesmo aqueles que beijam a saia dos padres, rezar era sinônimo de beatice ridícula, vergonhosa. Que deve ser oculta de todos como se isso fosse um grande crime. Rezar se resumia a uma mentira social como o “vou rezar por você”; que na verdade, nada se rezava. Ou então, rezar era algo que os criminosos faziam. Criminosos como benzedores e médiuns. E novamente isso era uma grande blasfêmia para os moralistas religiosos. Era de conhecimento de todos os anjos que os criminosos, procuravam ler a Bíblia e se interagir dos preceitos de Deus, mais que os clérigos e Ministros Evangélicos.
Charlie, pela primeira vez em muito tempo não foi para o espaço. Lá não era o lugar onde ele encontraria as respostas que precisava ou a orientação que desejava. E por isso ele seguiu direto para ultima e mais importante dimensão. Lá ele logo procurou os anjos superiores na doutrinação, mas ele queria conversar com um em especial: Judá.
— Está me procurando? — Judá perguntou se aproximando com calmaria.
— Preciso de ajuda. Creio estar fazendo algo que não é permitido aos olhos de nosso Deus. — Charlie disse esbaforido, coçando a nuca e eriçando os cabelos curtos.
— Vem comigo. — Judá chamou apontando uma direção a sua frente. Ambos começaram a andar lado a lado. Judá mantinha uma calma irritante para Charlie que estava se sentindo mais humano que anjo. — Diga. Não tenha medo de critica.
— Tenho mais medo de te comprometer que outra coisa, meu caro. — Charlie disse num suspiro.
Olhou ao lado e percebeu que ninguém se preocupava com eles a não ser com seus deveres. Com desolação, Charlie contou o que se passava com ele. O ciúme crescente, o desejo infundado, e a paixão... Sentimento humano, mas que de algum modo se instalou em suas entranhas e ainda por cima, por sua pupila.
Judá escutou tudo com atenção e sem esboçar sentimentos ou recriminação. Quando Charlie terminou seu desabafo, olhou para o amigo de velhos tempos e esperou uma palavra que fosse e nada foi dito. Já estava cogitando se virar em seus calcanhares e voltar para sua pupila, por quem um sentimento saudoso e sufocante, crescia a cada segundo em seu peito.
Foi quando Judá deu sua resposta que a principio, parecia que de nada tinha haver com o caso de Charlie; apenas uma conversa banal entre velhos amigos.
— Há muitos anos, não me sei bem o tempo, mas acredito que tenha quase quatro milênios... Um homem, irmão de muitos, se deixou guiar pela cabeça inconstante deles e vendeu seu irmão como escravo... ciúme bobo e quem sabe até mesmo inveja. — Judá meditou consigo mesmo, perdido em lembrança. — Conhece essa história? — Judá perguntou de repente a Charlie que deu de ombros, como se isso nada fosse importante. Era natural que Charlie não conhecesse a história, tendo em vista que ele fora criado muitos anos depois, apenas dois séculos antes da criação do espírito Luz de Ternura. — Esse homem estava casado e teve treze filhos com sua mulher. Eram tempos de guerra. — Meditou consigo numa grande tristeza. — As crianças de algum modo eram diferentes e mais diferentes ainda quando já adultos não envelheciam, não morriam, e quando deparados com uma guerra eles assumiam a forma de filhotes de leões com grandes asas. Eram vorazes, mas bem adestrados, por assim dizer... Não matavam por matar, apenas para acabar com a guerra... Ganharam então o nome de Leões de Judá. — Judá calou-se, esperando a compreensão nos olhos do amigo, como nada houve, ele revirou os olhos e continuou sua história. — Judá, atormentado, perguntou a sua mulher Elisa o que havia de errado com seus filhos. Qual a surpresa dele quando Elisa se virou para ele e respondeu: “É porque eles são frutos de um anjo com um humano”. Ele se virou e disse que aquilo não era possível porque tanto ele quanto a esposa eram humanos... foi quando algo lhe ocorreu e tomado por ciúme, indagou se a mulher o tinha traído, mesmo que fosse com um anjo. A mulher nada disse, apenas deixou suas asas aparecerem, sua pele reluzir e suas vestes se transfigurarem para vestes azuis celeste com detalhe verde oliva.
— Isso realmente aconteceu? — Charlie perguntou espantado.
— Sim, comigo. — Judá respondeu simplesmente e sorrindo, apontou para frente, onde Elisa estava distraída, olhando para uma arvores de flores amarelas.
— E você não fora digno de julgamento? Não era errado? Digo, ela era um anjo...
— Ela tinha sido destinada a mim. Era o destino dela. Era o meu destino. Devia ter aprendido nesses anos que você existe, que nada se realiza sem seja da vontade DELE.
— Obrigado, meu amigo. — Charlie agradeceu e feliz voltou para sua Renée.
Os anos se passaram e o relacionamento deles era terno com momentos de paixão. Quando os pais da jovem começaram a importuna-la dizendo que era hora da mesma se casar, Charlie se viu obrigado a tomar uma atitude definitiva.
Assumiu a forma humana e se apresentou aos pais da mesma como um cavalheiro que busca a mão de sua amada. A recepção não fora boa. Os pais queriam para sua filha um homem que no mínimo tivesse carreira e uma casa para morar. Charlie correu e providenciou os atributos humanos necessários, tudo para que pudesse ficar com sua amada. Três anos se passaram até que ele conseguisse reunir o necessário: profissão e casa. Assumiu uma profissão humana muito próxima a antiga, era guarda-policial. A casa simples era aconchegante. Mesmo com relutância dos pais de Renée, ambos se uniram no matrimonio, e seguindo para outro estado construíram suas vidas.
Charlie por causa de sua condição inumana sempre se via numa situação complicada; hora assumindo sua forma de anjo, hora se equilibrando na vida humana. Quando na forma de anjo, as coisas não eram fáceis, nem todos seus colegas aceitaram sua decisão e sempre o importunavam. Quando humano, sua vida era complicada, porque ele parecia extremamente ingênuo para as artimanhas e mentiras humanas.
Um ano depois de unido a Renée, ela deu a luz a uma menina encantadora como a mãe, reluzente como o pai: Isabella Swan. Charlie tinha conhecido há muitos anos o espírito de Bella, que na época se chamava Lua do Cantor. E agora ele se sentia encantado pela honra de tê-la como sua filha. Lua tinha sido criada da ínfima parte da energia que deu origem a Charlie, então, agora, Charlie percebia que ela sempre fora sua filha, só que na época, ele não tinha entendido a excentricidade da criação.
Bella abriu seus olhos azul-esverdeados como da mãe e fitou a sua volta. Os médicos da sala ficaram espantados com o modo como a pele do bebê parecia reluzir, mas deixaram isso passar como se isso fosse algo normal.
Judá, único amigo que parecia entender o que Charlie passava, se aproximou dele quando este já estava em casa.
— Ela é muito bonita. E muito parecida com você. — Judá disse pegando a pequena no colo.
— Você também é um anjo? — Renée perguntou timidamente. Judá lhe sorriu e ao seu lado apareceu Elisa, sua companheira de eternidade.
— Não. Mas ela, sim. Eu sou apenas um homem que se tornou espírito e com o tempo evoluiu.
Elisa sorriu e pegou Bella do colo do companheiro. Bella olhava tudo com curiosidade incessante.
— Você terá que educa-la, Charlie. — Elisa disse com melancolia. — Não será fácil para ela entender a própria condição incomum em que vai se encontrar... Saber ler as pessoas ou sentir a energia dos que estão a volta dela... Ficará ainda mais difícil quando ela alcançar seu crescimento e se tornar diante do perigo, um pequeno leão de guerra. Ela terá que aprender a se controlar... controlar seus instintos... controlar sua força.
— O que aconteceu com seus filhos? — Charlie perguntou temeroso pelo futuro de sua pequena. Renée há tempos já tinha ouvido a história da boca de seu amado.
— Ainda vivem. — Elisa respondeu, mas parecia que ocultava algo. Vendo a curiosidade preocupada por parte do colega, esclareceu. — Não foram tão cuidadosos e se expuseram... cada um a seu tempo. Não é porque são incomuns que não puderam ser abatidos. — Calou-se, triste. E depois, como se a face de Elisa se iluminasse a uma recordação, ela acrescentou. — Hoje estão na terceira dimensão, ainda aprendendo.
Renée tomou no colo sua filha e pela primeira vez temeu ter feito escolhas erradas. Abrigou a menina em seu peito, aspirou o cheiro de bebê, e torceu para que nunca, nada de mal acontecesse com Bella.
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