terça-feira, 10 de dezembro de 2013

DA - Capítulo 16

~ 16 ~

Melinda

“Diga-lhe que sim, ainda que esteja morrendo de medo, ainda que depois se arrependa, porque de todas as formas você vai se arrepender por toda a vida se lhe disser que não.”

Gabriel García Marquez.

Mecanicamente, eu me levantei ao escutar o despertador soando de forma insistente. Realizei meu ritual matinal, e parti em direção ao meu tormento diário.

Eu não esperava encontrar Robert na R Blackwell Corporation. Não esperava que ele fosse me procurar. Ao menos não de forma consciente. Contudo, é engraçado como não se pode obrigar um coração a não ter mais esperanças. Eu, com certeza, não as tinha... mas era como se Robert fosse surgir do nada enquanto eu analisava um arquivo qualquer no escritório, ou mesmo bater à porta do meu apartamento. Coisas que eu estava certa de que não iriam acontecer, e que ainda assim, assolavam meus pensamentos.


Em geral, era como se essas fantasias substituíssem a imagem de Robert me abandonando, após descobrir minha total inexperiência com relacionamentos. Eu me sentia magoada, envergonhada, tola e extremamente fácil. No fim de tudo, fui eu quem permitiu que as coisas avançassem tão depressa. Eu dei vazão para que Robert cresse que não haveria problemas quanto à existência de algo extremamente íntimo entre nós dois. Na verdade, nem mesmo sabia se havia, de fato, algum problema da minha parte.

Tudo estava indo rápido demais. Talvez não tão rápido, se eu levasse em conta que estava encantada por Robert há tantos anos, graças aquela bendita fotografia! Mas aquilo poderia ser levado em conta? Quer dizer... eu o imaginava de uma forma sublime, e depois do acidente, quando ele me atropelou, era como se fossem duas pessoas diferentes. Contudo ele voltou atrás em sua postura, e durante o tempo que passamos juntos, ele se mostrou tão atencioso, prestativo, envolvente. Talvez... talvez... apaixonado? Bem, provavelmente, não apaixonado no sentido corriqueiro, mas a forma como seus lábios tocavam os meus, e suas mãos o meu corpo, era tão... tão... argh!

Quando foi que eu adquiri toda essa inaptidão com palavras, exatamente? Por que era tão difícil encontrar um adjetivo adequado? Como se isso fosse mesmo importante! O fato era que nada disso importava mais! Robert descobriu, talvez cedo demais, que eu não era o tipo de garota certa para ele. Quem sabe Christine não estivesse certa durante todo esse tempo, e me guardar tenha sido uma estupidez total?! Só que eu não conseguia nem mesmo cogitar a ideia de outros lábios contra os meus, que não fossem os de Robert, como eu poderia?... Não! Isso não era possível! Aparentemente, entre nós dois, apenas não era para acontecer.

As coisas tomaram caminhos errôneos por um tempo, e que pareciam extremamente certos, para mim, mas agora tudo deveria seguir seu curso original. Tudo precisava ser como deveria ser, ainda que fosse pesaroso demais para mim.

***

― Você não se cansa disso? ― Christine inquiriu com suas sobrancelhas franzidas, e o olhar fixo no jornal que eu segurava com ambas as mãos.

Nós havíamos acabado o almoço há alguns minutos, e eu aproveitava o tempo que havia restado para checar os anúncios de emprego no jornal. O restaurante já não mais estava abarrotado de gente, então eu não considerei rude checar os classificados.

― Ainda não encontrei nada satisfatório! ― eu dei de ombros, fingindo indiferença e casualidade.

A ruiva à minha frente bufou longamente, revirando os olhos para mim.

― Aceite que você já tem o melhor emprego que pode conseguir no momento, Linda! ― ralhou. ― Você está na R Blackwell Corporation há quase dois anos, não está longe de receber um aumento de salário, ou quem sabe uma promoção! ― ela sugeriu animadamente.

― Eu não preciso de um aumento ou de uma promoção, Chris ― okay, isso era mentira. ― Preciso apenas... de novos ares! ― isso era verdade.

― Novos ares? ― ela testou sardônica. ― Talvez novas bocas, também.

― Chris!

― Eu só estou dizendo... ― ela começou, com as palmas de suas mãos erguidas em minha direção, num sinal de defesa. ― Que é ridículo você pedir demissão da empresa, apenas porque as coisas com o chefe não saíram como esperado ― ela deu de ombros, num gesto displicente.

Isso não era fugir, era? Não totalmente, pelo menos. A meu ver, era apenas procurar uma solução não tão complicada. Permanecer naquela empresa somente traria sofrimento desnecessário, que eu poderia evitar pedindo demissão e buscando um novo emprego. Eu não queria permanecer na R Blackwell Corporation, e ter que assistir Robert se lamentar pelo nosso breve relacionamento, eventualmente. Porque ele o faria, certo? E isso implicava num “vamos esquecer o que se passou, fingir que nada aconteceu”. Todavia, eu não queria esquecer, ou mesmo fingir que nada aconteceu. Por mais breve que possa ter sido nosso envolvimento, foram meus dias mais felizes, onde eu me senti mais completa e realizada. Não era justo ter que me esquecer dessas sensações.

― Você poderia procurá-lo, e tentar esclarecer as coisas.

Meus olhos encararam os de Christine, surpresos por sua sugestão. Eu não poderia simplesmente procurá-lo. Não me parecia certo. Seria, na verdade, invasivo... egoísta. Porque mesmo amando-o com todo meu coração, eu ainda não estava pronta para um passo tão longo. Dar a Robert um relacionamento completo, como aqueles aos quais ele estava acostumado, era algo que eu ainda não poderia administrar.

Eu achava.

Contudo... quais exatamente eram os tipos de relacionamentos a que Robert estava acostumado? Com toda certeza, não do tipo que implica levar as namoradas até uma reunião de família, e essas eram palavras de Elizabeth. A conversa que nós tivemos na última vez em que estive em sua casa ainda estava muito clara em minha mente.

Eu me lembrava perfeitamente de que, depois de algum tempo absorta num assunto comum com a família de Michael, um comentário tingido de escárnio, partindo de Britney, fez com que Elizabeth me convidasse para ir até o seu quarto, e ver algumas fotos de família.

Foi ali que nós realmente pudemos nos conhecer. Ela me mostrou diversas fotografias de Robert, cada uma mais encantadora que a outra. Mas havia algo muito diferente nelas. Seus olhos pareciam mais cálidos, doces e inocentes com o brilho pueril que vinha deles e, revirando outras fotografias, percebi que, em algumas, a diferença era gritante. Quer dizer: o olhar de Robert não estava apenas diferente do olhar ao qual eu me acostumei, estava diferente do seu próprio olhar, enquanto criança. Aquele era um olhar vazio, distante, inexpressivo...

― Matthew ― Elizabeth me sussurrou quando eu me demorei tempo demais analisando a foto em minhas mãos. A que tinha o olhar vazio. Eu a fitei em desentendimento, buscando uma explicação, enquanto ela olhava para o amontoado de fotografias sobre sua cama, onde estávamos sentadas, mas sem realmente vê-lo. ― Ele era irmão gêmeo de Robert, como você pode perceber... ― um sorriso triste moldou seus lábios. ― Matt morreu quando tinha oito anos... ele... ― Elizabeth engoliu a saliva com dificuldade. ― Ele se afogou.

Seu olhar parecia perdido, aparentemente os pensamentos dela haviam migrado para as dolorosas lembranças do passado. Eu não sabia o que era perder algum familiar, mas sabia como era não ter nenhum.

― Eu sinto muito ― sussurrei para ela. ― Eu não fazia ideia...

― Já posso imaginar ― desconversou enxugando uma lágrima teimosa que escorreu por sua bochecha. ― Rob é tão fechado, eu não consigo vê-lo despejando essas informações sobre você.

Ela sorriu, de um modo singelo, e eu a acompanhei.

― Você também não precisa falar disso. Entendo que seja algo difícil.

― Sabe... ― ela voltou a falar, tentando parecer um pouco mais animada que antes. ― Quando Robert disse que traria alguém para o aniversário de Sofie, eu não gostei muito da ideia...

― Ah... ― eu emiti em surpresa, sem conseguir evitar que o som abandonasse meus lábios.

Elizabeth, dessa vez, realmente riu. Soou baixinho e contido, mas ainda era um riso.

― Acho que foi por isso que eu medi você, ao invés de tratá-la da forma como você merecia.

― Da forma que eu merecia? ― testei, aturdida.

Oh, meu Deus, qual era exatamente a forma que eu merecia?

― É ― admitiu. ― Você sabe, eu fui rude sem motivo algum! ― ela falou corando. ― Mas eu pensei... quer dizer... quando eu poderia imaginar que meu irmão traria alguém decente? Eu não tinha uma base comparativa ― ponderou para si mesma. Seus olhos brilhantes se voltaram para mim, e ela me lançou um sorriso amplo, que era extremamente acolhedor. ― Sofie ter gostado de você, foi um choque para mim! ― confessou.

― Foi um choque para mim, também ― admiti.

― Foi um choque geral! ― ela se decidiu. ― Ela é sempre tão... fechada. Mas com você... não foi preciso mais que algumas poucas palavras para que ela se encantasse por você. ― Eu mordi o lábio inferior, escondendo um sorriso. ― Assim como o meu irmão.

Dessa vez eu não sorri. Poderia jurar que meus olhos estavam arregalados, e minha boca formando um perfeito “O”. Robert não estava encantado por mim... as coisas não eram assim, tão extremas.

― Acho que você está superestimando os sentimentos dele com relação a mim, Elizabeth ― balbuciei em protesto. Ela não sabia ao certo o que nós tínhamos. Eu não sabia ao certo o que nós tínhamos. Quer dizer, ele e eu éramos namorados, sim, mas não era como se ele tivesse me feito um pedido formal, declarando seu amor por mim.

― É você quem não está entendendo, Linda! ― ela objetou, parecendo ofendida por eu não conseguir ver a obviedade que ela via. ― Robert jamais trouxe uma namorada em casa! Ele sequer já teve um compromisso sério na vida! Trazê-la até a minha casa, é um divisor de águas.

― Divisor de águas ― eu repeti mecanicamente. O que isso significava?

― Você não tem noção da forma como ele olha para você ― ela murmurou em entendimento, com suas sobrancelhas loiras franzidas sobre a pele de porcelana. ― Acho que nem mesmo ele, tem noção!

― Eu não estou entendendo ― confessei num riso nervoso, exasperada.

― O que eu quero dizer é que ele está... ― ela mordeu o lábio, abortando o que estava prestes a dizer. Balançando a cabeça de um lado para o outro, levemente, ela riu a despeito de si mesma, voltando a me encarar. ― Eu não posso falar isso por ele, me desculpe. Por ora, basta saber que você tem um significado nas nossas vidas, agora.

― Nossas? ― inquiri perplexa.

― Você é importante pro meu irmão e pra minha filha ― ela apontou casualmente. ― Isso faz de você alguém importante para mim, também.

Pisquei meus olhos rapidamente, aturdida. Ela não poderia estar falando sério, poderia?

― Eu não sei o que dizer! ― articulei.

― Apenas prometa que não vai desistir do meu irmão ― ela sugeriu. Seu tom de voz era casual, no entanto, seus olhos mais pareciam fazer uma súplica. ― Ele pode ser difícil e impulsivo, contudo ele tem seus próprios motivos. ― Elizabeth segurou minha mão livre entre as suas, enquanto a outra permanecia segurando a foto de Matthew Blackwell. ― No fundo, ele só precisa de alguém que se importe com o menino que ele foi um dia. E você é esse alguém, Linda.

De fato, eu não havia compreendido o significado completo por trás das palavras de Elizabeth, entretanto eu me vi meneando a cabeça afirmativamente, por duas vezes. Eu não queria desistir dele, não queria...

***

― Você tem certeza disso? ― eu inquiri a Christine duvidosamente.

Ela suspirou, fitando o nada à sua frente. Ela já havia desligado seu computador, e colocado um ponto final em seu expediente, enquanto eu... estava protelando o momento inevitável em que teria que ir para casa, e me trancar com minhas ponderações e pensamentos indesejáveis. Se ao menos Javier não estivesse dando aulas de dança essa noite, talvez nós pudéssemos fazer alguma coisa. Mas eu andei tão sumida ultimamente! Seria muito injusto aparecer do nada, justo quando não estou bem. Não, Javier não merecia algo assim.

― Quais as outras opções? ― avaliou irritadiça. ― Me sentar aqui, e assistir a minha vida ir embora? Ah, por favor!

Alguém ― além de mim, é claro ― deveria dizer a ela que sua vida não estava indo embora apenas porque o chefe do RH decidiu cortejar uma garota do seu próprio setor, ao invés dela. E, obviamente, que esse não era motivo suficiente para aceitar sair com um cara que ela nunca vira antes, apenas porque ele era amigo do namorado de sua prima... e acabara de receber uma promoção.

Em resposta, eu apenas dei de ombros, e assisti Christine desaparecer pelo corredor a fora.

Sozinha, eu me dei conta de que tudo era ainda mais nocivo, ali. E como não poderia ser, se o fato de eu estar procurando um novo emprego, era justamente porque tudo ali era... Robert demais?

Provavelmente ele já nem estivesse mais na empresa, entretanto era como se não fizesse muita diferença! A presença dele, ou os resquícios dela, era forte demais. Com um suspiro resignado, eu me dirigi ao toalete, apenas para checar o quão não apresentável eu estava. Não que fizesse alguma diferença, é claro. Após jogar uma água no rosto, a fim de empregar algum frescor nele ― o que não funcionou ― caminhei lentamente em direção aos elevadores, apreciando o silêncio.

Os corredores vazios eram o reflexo de como eu me sentia interiormente. Era isso, então. Depois de um intervalo com contentamentos na minha monótona vida, as coisas voltavam a ser como eram.

Poucos passos me distanciavam do elevador, agora, e foi nesse exato momento que eu ouvi meu nome. Uma versão urgente e aliviada de “Linda”, soando ao fim do corredor. O timbre era grave e familiar, e pude me sentir praticamente congelando em minha posição.

Mas que droga! ― eu chiei enquanto retomava meus passos. Qual era o meu problema? Estava tão mal a ponto de escutar vozes?

― Linda! ― ouvi outra vez. Entretanto eu não me permiti oscilar. Acelerei minha caminhada, ralhando e irritando-me comigo mesma. Aquilo precisava parar.

Prestes a alcançar meu objetivo ― o elevador ― foi impossível ignorar um terceiro chamado. Contudo, não foi a voz que me fez parar, senão dedos firmes apertando meu pulso direito, ao passo em que eu era puxada de encontro a músculos firmes, e braços grandes se enrolaram ao meu redor. Com o olhar aturdido, eu ainda pude distinguir um par de olhos verdes penetrantes me fitando, e logo tudo se transformou num borrão.

Eu estava sendo prensada entre seu corpo e a parede. Uma mão apertava minha cintura, a outra se embrenhou em meus cabelos. Os lábios atacaram os meus esfomeadamente, e antes mesmo que eu pudesse apresentar alguma resistência, a língua persuasiva pediu passagem, e eu cedi. Um gemido de satisfação saiu do fundo da minha garganta, ao mesmo tempo em que movi minhas mãos afoitas para seus fios de cabelo macio. Dentro de mim existia um contentamento esmagador, que chegou junto com uma percepção: eu realmente havia sentido saudades. Muitas saudades, de absolutamente tudo. Do seu olhar, dos seus beijos, dos seus toques, da sua voz... de todo ele. Eu havia sentido mais saudades de Robert do que poderia conceber, e isso era aterrorizante e prazeroso ao mesmo tempo. Aterrorizante porque seria muito difícil ter que me manter longe dele, e prazeroso porque no momento, eu não precisava me preocupar em afastá-lo. Naquele pequeno espaço de tempo, éramos apenas ele e eu.

Ao menos até escutarmos pigarros e risinhos baixos, logo ao nosso lado. Robert se separou de mim com um rosnado descontente, e eu observei suas pupilas dilatas por apenas alguns poucos segundos, antes de ele dirigir seu olhar para quem quer que nos tivesse interrompido.

― Algum problema? ― questionou pouco satisfeito às mulheres que, agora, haviam substituído seus risinhos por rostos corados, respiração difícil e pouca coerência em suas palavras.

Eu me perguntei se me parecia daquela forma, e assumi que sim. De qualquer forma, as duas moças ganharam minha solidariedade.

― Problema algum ― a morena respondeu como se estivesse desculpando-se. A loira ao seu lado permaneceu calada, com olhos arregalados e a boca entreaberta. ― Nós só queríamos saber se... vocês vão utilizar o elevador.

Robert olhou para mim de soslaio, e eu ofeguei de forma desconcertante.

― Ainda não ― informou esboçando um sorriso que não deixava seus dentes à mostra. Não era um sorriso amistoso, como os que ele lançava para... para mim?

O pensamento me fez engolir em seco.

A morena concordou com um débil aceno de cabeça. Ela e a amiga passaram por nós, chamando o elevador, que não demorou mais que alguns segundos, e então elas desapareceram dentro dele.

Eu esperava realmente, realmente, que elas não dissessem nada do que acabaram de ver a ninguém.

Fechei meus olhos, e suspirei. Se eu não tivesse resistido tanto à ideia de ir para casa assim que Christine saiu... Mas eu o fiz. E ali estava, com os lábios de Robert a centímetros dos meus novamente. Virei meu rosto a tempo, impedindo que eles se tocassem, mas isso não impediu que Robert atacasse minha mandíbula, meu maxilar...

― Não, não, não... ― murmurei tentando empurrá-lo para longe de mim.

― Por que não? ― ele quis saber maltratando a pele do meu pescoço, agora. Levei minha mão até sua nuca, e afastei seu rosto do meu.

― Porque você não pode aparecer do nada e simplesmente me agarrar desse jeito! ― irritei-me.

Com um sorriso de lado ― dessa vez um sorriso verdadeiro ― ele segurou o pulso que eu havia utilizado para afastá-lo de mim, e sem tirar os olhos dos meus, beijou-o calma e demoradamente. Eu podia sentir o efeito que isso causara nos meus batimentos, e havia sido realmente desastroso.

― Mas você gostou ― ele provocou.

― Isso não... isso não interessa! ― gemi em desgosto. Claro que eu havia gostado, o que não significava que deveria ter acontecido. ― Meu Deus! O que você faz aqui a essa hora?

― O que você faz aqui a essa hora? ― devolveu.

― Bom, eu trabalho aqui!

― Eu também.

Claro que ele trabalhava. A empresa era dele, não era? Mas por que ele tinha que parecer tão calmo e casual? E por que eu ainda não havia levado meu pulso para longe do alcance dos lábios dele? Argh!

― Tudo bem, então ― consenti, puxando meu pulso do contato de Robert. ― Eu preciso ir embora.

― Eu posso te dar uma carona ― ele ofereceu brecando minha saída triunfal, e novamente me prensando contra a parede.

― Não, não pode.

― Sim, eu posso ― objetou decididamente. ― Nós precisamos conversar, e isso não é algo que possamos adiar. Foi por isso que fui procurar por você na sua sala, mesmo sabendo que seu expediente já havia terminado há bons minutos. Como não a encontrei em seu posto, vim testar o elevador, e aqui está você! Isso é tudo de que preciso para saber que nós não podemos mais protelar essa conversa ― articulou decididamente.

Ele realmente estava falando em adiamento? Quem foi a pessoa que me rechaçou e deixou sozinha em meu apartamento, mesmo?

― Essa não era sua opinião há uma semana, era? ― instiguei. ― Quando me deixou no meu apartamento, você não me pareceu alguém querendo conversar.

Ele apertou os olhos com força, fazendo o mesmo com minha cintura entre suas mãos. Um tremor perpassou meu corpo, mas eu fiz o meu melhor para ignorá-lo. Robert ao abrir os olhos possuía uma expressão de revolta. Talvez não com o que eu acabara de dizer, mas consigo mesmo. Eu não tinha certeza.

― É exatamente sobre isso que precisamos conversar ― informou numa voz baixa. ― Eu sei que não agi certo, eu não deveria ter ido embora sem uma explicação...

― Não há o que conversar. Eu sei o que sua atitude significou, e não estou julgando você. Eu só não... ― titubeei, mordendo o lábio. Só não queria criar expectativas? Era isso?

― “Só não” o quê? ― ele me encorajou, com seus olhos verdes e incisivos ainda sobre mim. Talvez eu devesse mesmo falar. Quem sabe ele não entenderia meu ponto de vista e decidisse que as coisas deveriam permanecer como estavam? Com nós dois longe um do outro.

― Eu quero levar boas lembranças disso tudo ― confessei. Seu olhar era atento, agora. Sondando minha expressão, como eu fazia com a dele. Suas sobrancelhas franzidas sobre os olhos aturdidos apenas enfatizavam sua confusão. ― Quando acabar, você sabe ― esclareci. ― Quero poder me lembrar de coisas boas, Robert, e a única forma de isso acontecer, é se nós deixarmos tudo como está.

― Você está... terminando comigo? ― testou embasbacado.

Meus olhos se arregalaram e minha boca se abriu em surpresa. Meu Deus, o que havia de errado com esse homem?

― Mas é claro que não! ― exclamei exasperada. ― Você terminou comigo! Você, e não eu! ― lembrei-o. ― O que estou dizendo, é que vamos deixar as coisas assim.

― Eu não terminei com você! ― retorquiu. ― Eu não...

― Você só não usou as palavras convencionais ― discordei. ― Mas no frigir dos ovos, deu na mesma coisa.

― Linda, eu estou aqui agora, querendo me explicar para você...

― Não quero suas explicações ― cortei-o.

Ele piscou seus olhos de cílios grandes e espessos repetidamente, como se estivesse buscando algum sentido para o que eu acabara de dizer. Sua desordem não durou muito tempo, e quando ele realmente conseguiu me enxergar e não apenas ver, seu olhar já possuía a mesma determinação de sempre.

― Esse não é o lugar mais apropriado para conversarmos sobre isso, Linda, por favor. Eu estou pedindo apenas alguns minutos. Não precisamos falar no seu apartamento, deixe-me apenas levá-la para jantar num lugar tranquilo, aconchegante, e eu tenho certeza de que...

― Robert... ― eu chamei interrompendo-o. Não era o que eu queria fazer, mas era o que precisava ser feito. Eu me lembraria de cada palavra e de sua insistência para o resto da vida, e isso me traria algum conforto. Essa lembrança ficaria no meu baú de “boas memórias”, eu tinha certeza. ― Eu ainda sou a mesma ― apontei, ignorando o bolo que se instalou na minha garganta sem aviso prévio. ― Isso significa ― prossegui ― que eu não sou o que você precisa.

Esperei que as palavras cumprissem sua função, que fizessem seu efeito desejado. Aquele era o momento em que ele deveria concordar e me deixar ali, sozinha.

― Você é o que eu quero! ― rebateu.

Talvez ― apenas talvez ― se eu não tivesse sentido a determinação por trás daquelas palavras, elas não teriam me afetado tanto. Mas eu senti, e era como se elas tivessem um significado ainda maior do que o que eu poderia notar.

― Por quanto tempo mais? ― eu consegui perguntar, lutando contra a ardência nos meus olhos. ― É disso o que estou falando! Pode ser que você me queira agora ― eu me permiti acreditar naquilo, mesmo que apenas por um instante ou dois. ― Só que... o que vai acontecer quando você não quiser mais, e eu continuar interessada?

― Sou eu quem deve se preocupar com isso, não você!

― Resposta errada ― suspirei. ― É disso o que estou falando! ― murmurei, apontando a obviedade por trás das minhas palavras. ― Isso é algo com o que eu devo me preocupar. Eu!

― Linda...

― Não! ― voltei a interrompê-lo, com um dedo em riste em sua direção. Eu precisava terminar de falar. ― Há inúmeras formas de se terminar um relacionamento ― apontei. ― Algumas mais dolorosas que outras e... eu não quero correr esse risco, Robert. Me deixe apenas com as lembranças que já tenho, está bem? Nós já vimos que entre nós não funcionou, então...

― Por que você precisa ser tão teimosa? ― ele reclamou mais para si mesmo, através de dentes cerrados. Minha boca se abriu para que eu pudesse dizer alguma coisa, mas Robert me interrompeu. Suas mãos seguraram meu rosto firmemente à altura do seu, com poucos centímetros entre nós. ― Eu também posso ser muito teimoso, Linda, e nós não vamos sair daqui até que você aceite me escutar, está bem? Ouvi toda sua argumentação, mas agora é a minha vez de argumentar!

― Qual é a razão de toda essa insistência?

Ele não respondeu ao meu questionamento, e suas mãos em meu rosto me afagaram antes que ele voltasse a falar.

― Apenas escute o que eu tenho a dizer e, se depois disso, você não quiser mais me ver... ― ele hesitou, talvez pesando suas palavras. ― Se não quiser mais me ver, prometo respeitar sua vontade.

Puxei uma lufada de ar por meus lábios entreabertos, tentando me estabilizar dos efeitos que o hálito de Robert resvalando contra meu rosto me causava.

Quais eram as minhas opções? Se eu dissesse que não o escutaria, ele me deixaria simplesmente ir embora? Claro que não. Ele mesmo havia me dito que não.

Uma conversa era o que ele queria, então? Uma última conversa? Ele a teria.

***

― Você tem certeza? ― Robert questionou já em frente ao meu prédio. ― Tem certeza de que não quer que eu a leve para jantar?

Nós ainda estávamos dentro de seu Mercedes, e eu fitei a fachada do conjunto de apartamentos onde eu morava, através do vidro ao lado do banco do passageiro.

― Não estou com fome ― assegurei-lhe. ― Mas estou cansada, então se você puder ser breve...

A mão direita de Robert segurou os fios de cabelo presos à minha nuca, e girou meu rosto em sua direção.

― Que tal se nós subíssemos? ― sugeriu. ― Eu me lembro de você falar algo sobre eu não precisar de um convite.

Oh, ele se lembrava?

― Eu me lembro de você ter anulado isso quando me rechaçou por ser virgem.

As palavras saíram sem que eu me desse conta, chocando a mim e a Robert. Abaixei o olhar, envergonhada, querendo fugir do dele.

― Certo... eu fiz ― anuiu. ― Então acho que terei de ser articulado e sucinto aqui mesmo ― ponderou.

― Espero que mais sucinto que articulado.

Ele riu uma vez, sem humor.

― Linda... ― ele começou em voz baixa. ― Eu sei que não fui justo com você na outra noite, estou ciente disso! Mas não foi minha intenção ser rude ou ferir seus sentimentos, consegue entender isso? ― acenei em concordância uma vez. Eu conseguia, certo? ― Então olhe para mim.

Icei meus olhos em sua direção. Seus dedos se flexionaram contra minha nuca num afago, e meu coração bateu mais depressa automaticamente.

― Pare com isso, por favor ― pedi segurando seu pulso, tentando afastar sua mão de mim. Sem sucesso. Ele apenas me segurou com mais firmeza, inclinando-se em minha direção.

― Por que está tentando lutar contra o que sente, Linda? ― exigiu. ― Você não vê que isso é inútil? Que me mandar embora não vai aplacar o desejo que sentimos um pelo outro?

― Um relacionamento precisa de mais coisas que simples desejo ― objetei.

― Não acha que há mais do que isso entre nós?

― Há? ― eu quis saber.

Robert soltou uma risada irônica, balançando sua cabeça de um lado para o outro, visivelmente incrédulo.

― Vamos para o campo das suposições ― ele deu de ombros, numa sugestão. ― Se algo me acontecer quando eu estiver saindo daqui ― sugeriu casualmente, como se comentasse a cor do terno que usava. ― Digamos que eu esteja transtornado e bata o carro ― decidiu. ― Então você recebe a notícia de que eu estou morto... ― senti meu corpo gelar enquanto imaginava a cena. Meus olhos se prenderam aos dele, que se encontravam mais sérios do que nunca. ― Isso não mexeria com você? ― quis saber. ― Não a faria derramar uma mísera lágrima, por menor que fosse? ― ele semicerrou os olhos em minha direção, instigando-me a... a não sei o quê! Talvez a ser cruel?

Foi só então que eu percebi que minha mão ainda estava em seu pulso, no mesmo lugar em que a coloquei para retirar a sua própria da minha nuca. Meus dedos se fecharam com mais força sobre aquele local, mas eu não tentei afastá-lo.

― Mas que tipo de pergunta ridícula é essa? ― guinchei em protesto, lutando contra as lágrimas que queriam escapar.

― Do tipo que não pode ficar sem uma resposta ― devolveu.

― Meu Deus, você está sendo extremista, Robert! Uma coisa não tem nada a ver com a outra!

― Tem a ver sim, Linda ― discordou com veemência. ― Sabe por quê? ― ele não esperou por uma resposta para que pudesse continuar. ― Porque se isso acontecesse, se você me dissesse que iria sentir a minha falta... então você teria perdido a última oportunidade de estar nos meus braços! Consegue ver isso?

― Isso que está fazendo... ― eu gaguejei de volta para ele. ― Isso não é justo!

― Só estou fazendo com que você entenda! ― protestou. ― Não dá para ficar se resguardando assim, Linda! Ninguém consegue aquilo que quer sem ter que assumir um risco ou dois.

― E que riscos você está assumindo? ― instiguei. ― Nenhum!

― Estou assumindo o risco de você me enxotar da sua vida... como costuma fazer!

― Eu não...

― Você vai negar? ― ele me interrompeu com indignação. ― Vai negar que fugiu de mim quando eu a beijei pela primeira vez? Ou você prefere negar que me evitou por todos os dias que se seguiram depois do beijo? Talvez eu deva citar a forma como você frisou nossa relação de chefe/funcionária depois de ter correspondido aos meus beijos com tanto fervor! ― ofereceu.

Eu fechei meus olhos com força, cansada. O que era tudo aquilo? Por que tocar nesse assunto justo agora? Nada fazia sentido! Eram coisas completamente distintas.

― O que você quer de mim? ― murmurei derrotada. Talvez se ele fosse direto ao ponto, eu poderia mostrar o quão imprópria para ele eu era.

― Por que é tão difícil aceitar que eu quero apenas você? ― quis saber. Eu senti quando seu hálito quente bateu contra os meus lábios, e abri os olhos, alarmada tanto por suas palavras quanto por sua proximidade. Duas esmeraldas me encararam em retorno, e mesmo com a escuridão parcial, eu pude distinguir a linha tênue que contornava suas pupilas dilatadas. ― Diferente do que pensa... quero e preciso de você, Linda! ― sua voz era apenas um sussurro rouco quando ele falou trazendo sua mão esquerda até o meu rosto, mantendo-o seguro entre suas mãos grandes. ― Eu não desisto facilmente ― alertou-me. ― Se você me mandar ir embora hoje, eu vou continuar tentando...

― Mas você prometeu que respeitaria a minha vontade ― eu o lembrei debilmente.

― Sua vontade é ficar comigo ― apontou. Engoli em seco, constrangida. Era realmente indisfarçável, no fim das contas. ― Mas pode tentar negar, se quiser ― ele sorriu provocador. Riu, na verdade, e o som era encantador e convidativo. ― Diga que você não me quer, que seu desejo não é estar comigo, e irá se ver livre de mim para sempre. Muito simples, não acha?

Tentei sacudir minha cabeça algumas vezes, numa tentativa inútil e incoerente de arrumar meus pensamentos, entretanto, as mãos de Robert seguravam-na firmemente, me impedindo.

― É melhor você ir embora ― opinei.

― Você sabe o que tem que dizer para que eu vá embora.

― Robert...

― Ouça, Linda... ― ele recomeçou. Então ele estava disposto a argumentar ainda mais! Que coisa incrível! ― Eu não estou dizendo que sou a melhor opção que você tem... ― arregalei os olhos em surpresa. Do que ele estava falando, agora? Opções? Oi? ― Mas eu quero uma oportunidade com você! Não sou nada romântico, e essa é a primeira vez que embarco em um relacionamento ― apontou. ― Há uma parte minha que, eu desejo que você jamais conheça, porque ela definitivamente não é boa! Também não sou um príncipe encantado, ou o cara certo... na verdade sou o oposto disso, mas eu quero você, e sei que também me quer!

Pisquei aturdida algumas vezes. Ele estava falando sério? Aquela era a forma pela qual ele estava tentando me convencer a ceder aos meus instintos?

― Você está brincando, não está? ― inquiri.

Ele negou com um meneio de cabeça. Sua expressão séria enquanto olhava para mim.

― Estou falando muito sério, Linda ― assumiu. ― Não sou o melhor homem que você já pode ter conhecido, e sei que não mereço você. Mas que homem merece? ― ele deu de ombros num gesto displicente, e um sorriso de canto surgiu em seus lábios. ― Ainda assim... ― continuou. ― Você quer estar comigo, de tal modo que... por que não?

Por que não? ― questionei a mim mesma. Porque eu corria o risco de me machucar? Bem, vê-lo ir embora doeria. Porque eu corria o risco de me apaixonar? Como se eu já não estivesse apaixonada.

― Eu não acho que possa oferecer tudo o que você precisa ― sussurrei tristemente. De fato, eu tinha certeza de que não poderia oferecer-lhe tudo de que ele necessitava.

― Está falando de sexo? ― testou incisivo. Senti minhas bochechas enrubescerem, contudo não me permiti desviar o olhar. Esse era um dos pontos, não era?

― Foi por causa disso que você me deixou ― eu o lembrei. ― Pelo fato de eu ser virgem. Bem, isso não mudou.

― Eu me espantaria muito se tivesse mudado ― confessou apertando seus olhos em minha direção, num semblante quase dolorido. ― Acho que, eu ficaria ainda mais aturdido do que fiquei quando soube que você jamais havia estado com um homem intimamente.

― Desde o começo, eu mencionei ser diferente das garotas com quem você costuma sair ― apontei.

Seus dedos afagaram minha bochecha antes de ele dizer algo.

― Isso torna você ainda mais fascinante ― sussurrou. ― E antes que você pense que isso é parte de algum fetiche sórdido ― ele riu sem humor. ― Eu me comprometo a esperar o seu tempo...

― Robert...

― Eu juro não tocar em você com segundas intenções a menos que me implore ― ele continuou, me ignorando. ― Mas eu quero você, Linda. Preciso de você! Então... fique comigo... ― ele sussurrou com seus olhos em súplica.

Eu já havia chegado num consenso, e isso só fez com que eu me desse conta de que, era mais forte do que eu pensava, e que não voltaria atrás em minha decisão, que já estava decididamente tomada. Iria com ela até o fim, aceitando suas consequências.

Robert se inclinou em minha direção, e eu sabia que ele planejava me beijar. Fiz uso de todas as minhas forças para impedi-lo, pousando meu dedo indicador sobre seus lábios. Ele me lançou um olhar cansado, e eu suspirei em resignação. Era aquilo mesmo, não era?

Mas é claro que sim!

Eu o olhei atentamente antes de finalmente dizer o que queria... o que precisava para encerrar aquele assunto de uma vez por todas.

― Tente não me machucar, Robert... ― supliquei.

Ele permaneceu imóvel, me encarando. Deslizei meu dedo indicador sobre seus lábios, e depois os acariciei brandamente com o polegar. Pressionei minha boca contra a sua, empurrando minha língua contra ela logo em seguida. Robert entreabriu seus lábios, e deslizei minha língua entre eles, provando-lhes o gosto, a textura e a sensação que me causavam. Minha mão acariciou os pelos da barba por fazer de Robert, os fios de cabelo de sua nuca, e ele me beijou com mais voracidade, deslizando seus dedos pelo meu ombro, rumando as minhas costas e traçando a linha da minha coluna. Eu tremi sob seu toque, entreabrindo meus lábios para puxar uma boa lufada de ar. Robert puxou meu lábio inferior entre seus dentes, sugando-o logo em seguida, e suspirei de contentamento, me agarrando mais a ele.

Eu havia dito sim, afinal. Não com palavras, mas em ações. Eu havia lhe dito sim, porque eu não queria desistir dele, de nós dois, e eu era forte o bastante para tentar fazer com que déssemos certo.

***

O dia estava fresco, e eu podia sentir o vento batendo contra o meu rosto, jogando meus cabelos longos para trás. Dei um gole generoso no meu refrigerante e ignorei minha vontade de checar o relógio.

Ele estava atrasado, mas disso eu já sabia. O que eu gostaria de verificar era o quão atrasado ele estava, agora. Pensei em telefonar-lhe, mas não me pareceu uma boa ideia, porque isso poderia parecer possessivo, certo? Eu não queria parecer possessiva. Na verdade, tudo o que eu queria era que nós funcionássemos.

Os últimos dias foram simplesmente surreais, e eu me sentia a pessoa mais afortunada do mundo por poder vivê-los. Era como ter minha vida entrando nos eixos depois de tanto tempo vagando por aí, sem um rumo fixo. Eu havia jantado com os González noites atrás; saído com Lizzy e Sofie para uma tarde de compras no shopping; respondido às inquisições de Christine após saber que Robert e eu fomos pegos aos beijos no corredor, e mesmo depois de ter tido que explicar ― em partes ― como aquilo tudo aconteceu, ainda tinha disposição o bastante para passar algum tempo de qualidade com o meu... humm... namorado.

Esse termo ainda me deixava um pouco nervosa e hesitante, mas eu não via algo mais propício para descrever o que Robert e eu tínhamos. Eu me sentia segura ao lado dele, mesmo que o medo inicial ainda planasse ao meu redor. Obviamente ele tem se portado como um perfeito cavalheiro... um lorde inglês seria a definição mais adequada, contudo, mesmo os lordes ingleses têm necessidades físicas, e não que eu não quisesse atender essas necessidades, mas e se eu não conseguisse de fato atendê-las?

Okay, esses pensamentos não estavam trazendo nada de bom, aparentemente. Talvez eu devesse apenas ir embora, já que minha espera vinha durando tanto tempo, mas nesse caso como eu...

― Oi ― a voz rouca e familiar interrompeu minhas ponderações, logo após Robert depositar um beijo demorado em minha nuca. O contato enviou um arrepio de prazer que reverberou em todas as minhas terminações nervosas, e eu o assisti contornar a pequena mesa redonda onde eu havia decidido me sentar, e acomodar-se à minha frente. ― Sei que estou atrasado.

― Eu nem havia notado.

― Engraçadinha! ― ele falou num sorriso de lado. ― Fiquei preso tempo demais na empresa. Reunião de última hora. Tentei ligar pra você a caminho daqui, mas o meu celular estava sem bateria ― explicou. ― Você já pediu? ― quis saber, acenando com a cabeça em direção ao meu copo com refrigerante.

― Só uma bebida enquanto esperava por você.

― Tudo bem, acho que podemos fazer isso agora ― eu concordei com um aceno de cabeça, enquanto ele chamava um garçom para que viesse trazer um cardápio. Era um lugar simplório, escolhido por nós a esmo para que pudéssemos almoçar juntos todos os dias, ou a maioria deles, fugindo da agitação da R Blackwell Corporation e dos restaurantes sempre tão cheios ao seu redor.

― Sabe, eu estive pensando, e... quero levá-la a um lugar especial hoje à noite ― ele falou assim que o garçom se retirou, já tendo anotado nossos pedidos e nos deixado a sós.

― Lugar especial? ― eu testei. ― Qual sua definição de lugar especial?

― Humm... ― ele fingiu ponderar. ― Se eu disser, não vai ter a menor graça.

― Você não pode me deixar assim, às cegas! ― reclamei. ― Não é justo, sabia?

― Acho que você vai ter que confiar em mim, nesse caso ― ele deu de ombros, com um sorriso malicioso. E eu engoli em seco.

Confiar... nele?

Bom, eu confiava, mas aquela frase era tão dúbia. E aquele sorriso!... Será que ele queria... quer dizer...

Ai, meu Deus!

***

― Você ainda não pode olhar! ― Robert ralhou às minhas costas. Uma de suas mãos apoiada na base da minha coluna, e a outra em concha sobre os meus olhos.

― Eu não estou olhando! Mas vou tropeçar se você não caminhar um pouco mais devagar, ou me deixar ver o caminho! ― protestei.

― O que foi? Você não gosta de surpresas?

Sorri bobamente, sem saber ao certo se ele poderia ver o meu sorriso ou não.

― Talvez.

― Então aguente firme, estamos quase lá ― ele me encorajou.

Algumas passadas mais, e nós paramos. Minha respiração estava ruidosa, e a mão de Robert em minhas costas desapareceu dali. Escutei um barulho metálico, e o que parecia ser uma chave girando numa fechadura. Guiando-me uma vez mais, fazendo com o que eu me virasse à minha esquerda, Robert me fez dar mais umas cinco ou seis passadas.

― Não abra os olhos, ainda. Sem trapaça, okay?

― Okay ― eu concordei mordendo o lábio, enquanto ele se afastava de mim brevemente.

Ele estava indo fechar a porta, era isso?

― Tudo bem ― a voz dele soou, descontraída. ― Pode abrir, agora.

Minhas pálpebras tremeram, hesitantes, e eu pisquei repetidas vezes.

Era um vestíbulo, é claro, de alguma cobertura luxuosa. Havia um piano de cauda negro ao meu lado esquerdo, e uma escada larga e reta ao meu lado direito.

Um minibar em um dos cantos, sofás de couro negro em forma de ‘L’, separados por uma mesinha de centro baixa. Quadros que me pareciam expressionistas adornando as paredes, e um lustre que mais parecia saído de um dos filmes da Disney.

Passos titubeantes me levaram um pouco mais à frente, e eu podia sentir a movimentação de Robert logo atrás de mim. Eu parei por um momento, analisando um pouco melhor o ambiente ao meu redor. Era... confortável e requintado de uma forma peculiar.

― Uau ― eu sussurrei para mim mesma.

― Você gosta? ― Robert perguntou ao meu ouvido.

― É realmente... ― ponderei um pouco. ― É a sua casa! ― constatei embasbacada.

O riso baixo de Robert apenas confirmou o que eu já sabia.

― E você gosta?... Da minha casa? ― insistiu.

Eu me virei para olhá-lo, prendendo meu olhar ao seu.

― Ela é linda ― admiti. ― Mas eu não pensei que viria aqui tão cedo.

Ele riu brevemente, erguendo sua mão para acariciar meu rosto. Inclinei-me em direção ao contato, fechando os olhos para apreciá-lo melhor.

― Você me abriu as portas da sua casa ― sussurrou com seus lábios contra os meus. ― Só estou retribuindo o favor.

Então ele me beijou, passando seus braços longos e fortes ao redor do meu corpo, me apertando entre eles enquanto sua língua manipulava a minha. Passei minhas mãos por sua cintura, me apertando mais contra ele, querendo que o contato durasse um pouco mais.

― Meu apartamento não é grande coisa ― eu ofeguei quando ele abandonou meus lábios e mordiscou meu pescoço. ― Acho que ele caberia na sua sala de estar.

Robert riu contra minha pele, trazendo seu rosto para perto do meu, de modo que pudesse me fitar.

― Eu vou usar esse argumento contra você mais tarde, se eu precisar ― ele falou bem-humorado, me lançando uma piscadela. ― E vou te mostrar cada cômodo, mas isso só depois que nós jantarmos.

― Certo! Posso me virar com qualquer coisa que você tenha na dispensa, só preciso...

Ele pousou seu dedo indicador sobre os meus lábios, me interrompendo.

― Acho que eu fui um pouquinho mais rápido, e já me encarreguei de tudo. Vamos.

Sua mão deslizou pelo meu braço até segurar a minha, e ele me guiou pelo cômodo bem decorado, me indicando uma porta de madeira maciça à nossa esquerda. Ele a abriu, apontando com a cabeça para o seu interior, encorajando-me a entrar. E eu o fiz.

Havia uma mesa quadrada, que comportaria quatro cadeiras, mas havia apenas duas, ali. Estava perfeitamente posta, com talheres de prata e pratos de porcelana ― aparentemente. No centro da mesa havia um lindo arranjo de flores vermelhas, e eu praticamente asfixiei analisando tudo.

― Você fez isso? ― inquiri a Robert, incrédula.

― Não exatamente, mas dispensei os garçons, e eu mesmo irei servir nosso jantar.

Ele me conduziu até uma das cadeiras estofadas, afastando-a para que eu pudesse me sentar, e eu o fiz de bom grado.

― Você não precisa de ajuda? ― eu quis saber.

― De forma alguma! ― ele articulou falsamente ofendido. ― Você é minha convidada. Eu faço tudo!

Eu sorri para ele, recebendo um beijo rápido nos lábios.

Robert gracejou a maior parte do tempo enquanto nos servia, e durante o jantar não falamos nada além de amenidades. O clima se manteve casual, leve e divertido, e o tempo pareceu voar.

― Algo errado? ― Robert quis saber interceptando meu olhar efusivo direcionado ao arranjo de flores sobre a mesa, assim que terminamos nossa refeição.

― Não! ― apressei-me em negar. ― É só que... elas são tão lindas que até parecem artificiais ― articulei, fazendo um gesto displicente em direção ao arranjo.

Robert remexeu nele por alguns instantes, tirando um lindo botão posicionado bem no centro, e estendendo-o para mim.

― Essa, especificamente, é artificial para que você possa levá-la para casa, e se lembrar da noite de hoje.

Sondei sua expressão, percebendo o quanto ele estava sério. Meus dedos tocaram o caule fajuto que Robert me estendia, e eu o segurei firmemente entre eles.

― Obrigada ― murmurei baixinho.

― Não por isso ― devolveu esboçando um sorriso singelo. ― Agora, acho que podemos começar nosso tour, não?

Eu concordei num meneio de cabeça, assistindo Robert se levantar e afastar minha cadeira para que eu fizesse o mesmo.

― Por onde vamos começar? ― inquiri.

― Que tal pelo meu quarto? ― ele sugeriu ao pé do meu ouvido, mordiscando o lóbulo da minha orelha logo em seguida.

Engoli em seco. Eu poderia fazer aquilo, não poderia?

***

Eu não havia pensado em como poderia ser o quarto de Robert, anteriormente, mas a visão de agora, bem... me parecia a coisa certa.

A decoração era simples, mas... sofisticada? Havia uma cama espaçosa bem no centro do quarto, uma penteadeira, uma escrivaninha e uma poltrona mais ao canto. À esquerda, duas portas, provavelmente o closet e o banheiro. À direita uma porta de correr, para qual Robert me encaminhou quando viu meu desconcerto enquanto eu permanecia parada em meio ao aposento.

A porta levava a uma sacada com uma vista ampla da cidade, e eu me permiti ficar ali ao lado de Robert, em silêncio, abraçada a ele com a cabeça recostada ao seu peito, observando as luzes da cidade, e os aviões que passavam a muitos pés de onde estávamos.

― Você não se sentiu muito à vontade lá dentro ― ele murmurou contra o meu cabelo algum tempo depois.

― Não é isso ― objetei num suspiro. Eu estava mesmo nervosa ante a hipótese do que poderia acontecer lá dentro, mas não era como se eu estivesse tentando evitar. Levantei meu rosto, fitando seus olhos. ― Foi para isso que me trouxe até aqui, não foi? ― instiguei. ― Para que eu conhece o seu quarto, e então nós...

― Linda ― ele me interrompeu. ― Você está tirando conclusões precipitadas ― engoli a saliva com dificuldade. Ele iria contornar a situação? Talvez fosse melhor dizer a ele o que eu achava de tudo isso. Ainda cheguei a abrir minha boca para pronunciar algo, mas Robert me impediu. ― Sabe... eu tenho quase trinta e um anos ― comentou casualmente. ― Acho que estou pronto para assumir novas responsabilidades, estabelecer novos compromissos... Compromissos sólidos! ― franzi o cenho em confusão, e os dedos de Robert tocaram meu rosto numa carícia suave. ― Você se lembra de eu ter dito que queria você?... Que precisava de você?... ― assenti uma vez, ainda sem compreender onde ele queria chegar. ― Pois bem eu... ― ele titubeou, aparentemente buscando as palavras corretas. Quando não as encontrou, apertou os olhos, aparentemente frustrado.

― Robert, você pode falar sobre qualquer coisa comigo, está bem? ― assegurei tentando confortá-lo.

― Eu sei... é só que... não existe uma forma fácil de se dizer isso... ― ele riu incrédulo, mas era um riso nervoso, que tencionou todo seu corpo em contato com o meu.

― Apenas fale ― incitei. ― Seja o que for, eu sou capaz de entender.

Seus olhos verdes pousaram sobre mim novamente. Eles estavam intensos, sóbrios de uma forma que eu jamais havia presenciado antes. Suas mãos buscaram as minhas, e ele tocou o botão de flor que havia me dado há pouco na sala de jantar, abrindo-o e revelando o mais lindo anel que eu já tinha visto em toda minha vida. Meus olhos buscaram os de Robert, e assisti os lábios dele se moverem, como se ensaiassem as palavras, até que por fim ele as disse.

― Case-se comigo, Linda ― e eu congelei em minha posição. Meu queixo pendeu, e eu sabia que meus olhos estavam arregalados. Ele não poderia estar falando sério, poderia? ― Case-se comigo ― repetiu.

Pisquei meus olhos, aturdida, sem saber o que dizer. Ou melhor: sem saber como dizer! Robert me olhava ansioso, paciente... o que significava aquela expressão que ele carregava, exatamente?

― Eu... Robert... eu não... você... meu Deus!

Será que essa frase havia feito algum sentido, ou eu precisaria me esforçar um pouco mais?

― Espero que essa seja sua forma de dizer ‘sim’ ― ele tentou.

― Não!

― Não?!

― Sim! Quer dizer... ― eu apertei meus olhos, tentando trazer minha coerência de volta. ― Por que... por que isso agora? ― balbuciei. ― Isso está indo rápido demais!

― Eu preciso repetir que estou prestes a fazer trinta e um anos? Que quero algo mais concreto?

― Robert, isso não é motivo para pedir uma mulher em casamento! ― ralhei num riso histérico. ― Pelo amor de Deus!

― Linda ― ele chamou segurando meu rosto entre suas mãos, impelindo-me a olhá-lo. ― Esse não é o motivo... mas... ― ele titubeou outra vez, apertando seus olhos. ― Não é o que você quer? Um compromisso sólido? Foi por isso que você tentou se afastar de mim dias atrás, não foi? Porque não queria cogitar a hipótese de eu me estafar do que tínhamos, enquanto você permaneceria interessada! Então!

― M-mas isso é diferente! ― retorqui. ― Casamento é um passo tão longo... e nós estamos juntos há pouquíssimo tempo, eu não acho...

― Você está em dúvida? ― ele inquiriu transtornado. ― Está com medo de se comprometer, de esse ser um caminho sem volta? Achei que confiasse em mim!

― Eu confio! É claro que confio! ― devolvi. Robert se afastou de mim, enfiando suas mãos nos cabelos, maltratando-os e depositando neles toda sua cólera. Mas o que o deixava assim, tão aborrecido? O meu ‘não’ em si, ou o que ele significava? No caso, o que ele achava que significava!

Ele estava tentando provar que suas intenções eram sérias, era isso? Sim, claro que era! Mas o que mais isso poderia implicar? Que eu confiasse nele mais do que eu já confiava? Que confiasse a ponto de...

Engoli em seco, enquanto a compreensão me atingia.

Reuni toda minha coragem e força de vontade, e caminhei em direção a Robert. A forma como ele andava de um lado para o outro, praguejando a cada instante, não era nada convidativa, mas eu ignorei esse fato. Pousei minha mão livre sobre seu ombro, e seu corpo se retesou sob ela. Robert me fitou por sobre o ombro, e com um aceno de cabeça eu o convidei a deixar a sacada.

Seus olhos estavam vermelhos, duros, mas ele fez o que pedi, marchando de forma descontente até o interior de seu quarto.

― Robert ― eu chamei me aproximando dele outra vez, mas ele não se virou para me fitar. Posicionei-me em frente a ele, fechei o botão de flor que segurava, e o depositei em suas mãos, tomando seu rosto entre as minhas. Seu olhar impenetrável encontrou o meu, e me forcei a dizer a única coisa que eu poderia. A única coisa que deveria ser dita. ― Eu digo não à sua proposta de casamento ― murmurei, e ele tentou se afastar do meu toque, mas eu não dei tempo suficiente para que o fizesse. ― Mas digo sim a você ― retomei.

― Como? ― ele escarneceu infeliz.

Então eu o puxei para mim, beijando-o avidamente, fazendo-o ver a intenção por trás das minhas palavras. Mordisquei seu lábio inferior, invadindo sua boca com minha língua instantes depois. Minha mão esquerda acariciou sua nuca, e Robert emitiu um som gutural. O objeto que ele segurava atingiu o chão num baque surdo, e suas mãos grandes agarram meus quadris. Com a mão direita eu lutei contra os botões da camisa social que ele usava, ganhando de alguns deles. Quando sua mão ousou se infiltrar sob meu vestido, senti meu coração já acelerado palpitar ainda mais forte em antecipação, mas Robert não ousou muito mais que isso. Levei minha mão até a sua, arrastando-a sobre minha coxa e parando o movimento quando Robert apalpou minha nádega com força. Gemi de prazer, e ele espelhou meu gesto. Meus lábios migraram para o pescoço dele, dando-nos algum espaço para respirar, e senti quando ele içou meu corpo em direção ao seu.

Enrolei minhas pernas ao redor de sua cintura, e ele me prensou contra a porta do quarto. Eu realmente o desejava, não havia a menor sombra de dúvida! Eu o queria, queria pertencer a ele, e não me importava se seria ali. Na verdade, eu ansiava que fosse ali, naquela mesma noite.

Tentei me livrar da camisa dele enquanto sentia seus lábios sugando a pele do meu pescoço, mas não tive sucesso. Suas mãos agarraram minha cintura, e Robert se afastou para me fitar. Por que ele havia parado? Eu também o queria!

― Sexo não é a resposta! ― ele murmurou ofegante. ― Não foi por isso que eu a pedi em casamento, Linda.

― Mas...

― Shiii ― ele sussurrou colando sua testa à minha. ― Eu quero uma esposa, Linda... Não uma amante.

Eu arquejei em surpresa, e Robert pousou seu olhar ardente sobre mim, outra vez.

― Hora de ir para casa ― ele murmurou com sua voz rouca.

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